Retratos de um Apartheid Médico (Parte 7): Agências de supervisão fecham os olhos para testes em países pobres

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Crianças podres e famintas
Crianças podres e famintas

A supervisão europeia e norte-americana destes testes é mínima. Quando um fabricante de drogas decide lançar uma experiência clínica nos Estados Unidos ou na Europa, primeiro precisa alertar as autoridades reguladoras e enviar todos os dados pré-clínicos – dados de laboratório e de testes com animais, junto com planos detalhados de como planeia usar a droga experimentalmente em seres humanos. Dados de testes no exterior são aceites pelas autoridades reguladoras norte-americanas e europeias, mas nenhuma exige que os fabricantes de drogas as alerte antes de iniciarem as experiências no exterior. Para esses testes, a única exigência é que a Declaração de Helsínquia ou regras locais que por acaso garantam mais protecção sejam observadas. Se falharem – e 90% das drogas que entram nos testes clínicos falham em obter a aprovação reguladora – e não forem usados para apoiar o lançamento no mercado, então não há de facto controlo norte-americano ou europeu sobre as experiências. Sem descrição em parte alguma, os testes que fracassam nos países pobres simplesmente desaparecem sem deixar traços.

Nesse caso, a Declaração de Helsínquia é suficiente? Poderia ser. O principal mecanismo de força da Declaração de Helsínquia está nos comités independentes – comités de ética – que devem aprovar e supervisionar testes clínicos para assegurar que os direitos dos voluntários sejam protegidos. Seria óptimo se a infraestrutura ética e reguladora nesses países estivesse à altura da tarefa. Mas há provas indicando que em pelo menos alguns desses países, provavelmente não é assim. A Índiaé um exemplo.

Funcionários do governo na Índia estão interessados na expansão dos testes clínicos, pois vêem neles uma possibilidade de lucro. Vários funcionários dizem que esperam expandir os testes patrocinados pela indústria – de 70 milhões de dólares para 1 bilião de dólares por ano. Eles instituíram várias mudanças nas suas regras para facilitar os testes clínicos. As drogas experimentais não precisam demonstrar nenhum “valor especial” para a Índia, como antes. E as companhias que investem em pesquisa e desenvolvimento gozam de isenções de impostos por 10 anos [1]. A indústria dos testes clínicos é vista como um bom negócio para a Índia. De acordo com o Economic Times, o principal jornal de negócios do país, “as oportunidades são grandes, as multinacionais estão ávidas, as companhias da Índia estão a quere-lo. Temos as competências, as pessoas e temos uma vantagem que a China não tem e provavelmente nunca terá. O melhor é que esse é um tipo de deslocalização contra a qual os trabalhadores americanos não estão inclinados a protestar.”

O conflito de interesses dos reguladores do governo indiano não é insuperável. Uma possível abordagem seria aumentar a supervisão sobre os voluntários de testes. Mas, ao contrário, em quase todas as áreas de prática e pesquisa médica da Índia existe uma clara lacuna de regulamentos.

NOTA:

[1] Ken Getz, da consultoria de testes clínicos Center Watch, disse que foi recebido na Índia, como se fosse um chefe de estado. Ver também: Narayan Kulkarni (2003). «The trials leader». Biospectrum.

Continuação: 

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