A antiga cidade de Helike, situada na margem sul do golfo de Corinto, cerca de cento e cinquenta quilómetros a oeste de Atenas, foi originalmente fundada no início da Idade do Bronze (2600–2300 a. C.). A primeira povoação pré-histórica foi submergida pelas ondas cerca de dois mil anos antes de a cidade ter sido destruída. No Século VIII a. C. Homero escreveu que Helike enviara navios para a guerra de Tróia sob o comando de Agamémnon. Aquando da sua destruição, no Século IV a. C., Helike tinha-se tornado numa metrópole rica e bem sucedida, sendo a líder de doze cidades que compunham a primeira Liga da Acaia (uma união entre cidades-estado locais), e fundadora de colónias no estrangeiro como Priene, na costa da Ásia Menor, e Síbaris, no Sul de Itália. O templo de Helike e o santuário de Poseidon eram famosos por toda a Grécia clássica e apenas eram suplantados pelo Oráculo de Delfos, no outro lado do golfo.
Mas tudo isto mudou numa noite terrível do Inverno de 373 a. C. Durante um período de cinco dias, os cidadãos da cidade observaram estupefactos como as cobras, os ratos e outros animais fugiam da costa e procuravam terras mais altas. Então, na quinta noite, «imensas colunas de fogo» (que agora conhecemos como luzes de terramoto) foram vistas no céu, seguindo-se um enorme terramoto e um enorme tsunami com dez metros de altura. A planície costeira foi submersa e, à medida que Helike ruía, o tsunami arrastava os seus edifícios e habitantes para o mar enquanto as águas recuavam. A cidade e os arredores desapareceram para o fundo do mar, juntamente com dez navios espartanos ancorados no porto. A cidade vizinha de Boura e o templo de Apolo, em Delfos, também foram destruídos.
Quando uma missão de salvamento chegou ao local, na manhã seguinte, nada restava da outrora grande cidade excepto os topos das árvores do pomar sagrado de Poseidon. Talvez devido ao facto de Helike ter sido um respeitado centro do culto de Poseidon (o deus dos terramotos e do mar), deu-se início a uma tradição entre os seus vizinhos invejosos, para quem a destruição da cidade fora um castigo enviado pelo deus irado pela profanação do seu santuário. A seguir ao desastre, o território que pertencera a Helike foi dividido pelas cidades vizinhas e a cidade de Egio assumiu a liderança da Liga da Acaia. Séculos mais tarde foi construída no local uma cidade romana, que aparentemente também foi destruída, em parte por um terramoto no Século V d. C. Durante séculos após o desastre, escritores da antiguidade como Plínio, Ovídio e Pausânias relataram que as ruínas submersas de Helike podiam ser vistas no fundo do mar. O escritor científico, astrónomo e poeta grego Eratóstenes (276–194 a. C.) visitou o local e registou relatos de pescadores locais sobre uma estátua de bronze de Poseidon submersa numa lagoa e que muitas vezes prendia as redes de pesca. Mas pouco depois a zona foi atulhada e a sua localização perdeu-se.
Em 1861, arqueólogos alemães que visitavam a região encontraram uma moeda de bronze de Helike com uma magnífica efígie de Poseidon, mas nada mais foi encontrado nesse local. Todos os autores antigos afirmaram que as ruínas da cidade estavam submersas no golfo de Corinto, mas durante décadas houve inúmeras expedições que as procuraram sem sucesso. Em 1988 foi formado o Projecto Helike para localizar a cidade perdida, mas as buscas feitas com sonar não revelaram quaisquer indícios no fundo do mar. Consequentemente, a directora do Projecto Helike, a arqueóloga Dora Katsonopoulou, e o Dr. Steven Soter, do Museu Americano de História Natural, decidiram investigar a planície costeira. Em 2001, a alguns metros sob a lama e o cascalho, a equipa descobriu ruínas de edifícios clássicos, que vieram a ser identificados como as ruínas da cidade de Helike que fora destruída pelo terramoto de 373 a. C. As ruínas foram localizadas a quase oitocentos metros para o interior da planície, o que explica porque ninguém tinha conseguido encontrá-las no fundo do mar. Análises feitas a organismos microscópicos preservados numa fina camada de argila escura que cobria os edifícios revelaram que o local havia sido submerso por uma lagoa que eventualmente se entulhara. A descoberta de conchas marinhas e de possíveis restos de algas no local prova que as ruínas de Helike se encontraram no mar a dada altura.
As ruínas de um edifício clássico ilustram graficamente o infortúnio que se abateu sobre a cidade. Uma das suas paredes tinha ruído na direcção do mar, o que prova a destruição causada pelo recuo da onda gigantesca. Por entre achados de paredes demolidas, fragmentos de cerâmica e ídolos de terracota, os escavadores encontraram uma moeda de prata como nova, com uma efígie de Apolo usando uma coroa de louros, que fora cunhada na cidade vizinha de Sikion algumas décadas antes do terramoto. O triste destino desta outrora grande cidade clássica é visto por muitos como a inspiração para a lenda da Atlântida, registada em primeiro lugar pelo filósofo ateniense Platão alguns anos após o terramoto de Helike, em 360 a. C. Esse ponto de vista é reclamado num documentário da BBC Horizon chamado «Helike – A Verdadeira Atlântida», filmado em 2002.
A área em redor da antiga Helike é uma das que tem maior actividade sísmica na Europa e aí floresceram, e foram eventualmente destruídas por terramotos, várias povoações durante quatro mil anos. Assim, não é de admirar que a cidade fosse um local central do culto dedicado a Poseidon, o deus dos terramotos. Em Agosto de 1817, um terramoto precedido por uma grande explosão destruiu cinco aldeias no local onde outrora se localizara Helike. Em 1861, quinze quilómetros de costa afundaram-se cerca de dois metros e uma cintura costeira com cento e oitenta metros foi submersa pelas ondas. Em Junho de 1995, enquanto a equipa do Projecto Helike trabalhava no local, deu-se um terramoto de 6,2 graus na escala de Richter que matou dez pessoas na vila adjacente de Aigion e demoliu um hotel na moderna Eliki, matando dezasseis pessoas.
O Dr. Steven Soter recolheu muitas descrições de acontecimentos estranhos que precederam este terramoto e que têm semelhanças com os antigos relatos do terramoto que destruiu Helike. As pessoas ouviram ventos fortes quando o ar estava parado, os cães uivaram sem razão aparente, houve explosões subterrâneas, luzes estranhas e bolas de fogo no céu. Foram vistas grandes quantidades de polvos pelos pescadores locais e na noite anterior ao terramoto foram encontrados inúmeros ratos mortos na estrada, todos atropelados por automóveis quando tentavam escapar para as montanhas. Estes incidentes foram reminiscentes do comportamento dos animais no tsunami que em 2004 atingiu o Sri Lanka, o Sul da Índia e a Tailândia, causado por um enorme terramoto de 9,15 graus na escala de Richter com epicentro no oceano Índico. No Sri Lanka, onde pereceram dezenas de milhares de pessoas, os animais conseguiram aparentemente refugiar-se no interior da ilha antes que o tsunami se abatesse sobre ela. Apesar de o tsunami ter causado uma grande perda de vidas humanas na zona do Parque Nacional de Yala, a maior reserva de vida selvagem do Sri Lanka, não foram encontrados animais mortos. Os peritos acreditam que os animais têm um sexto sentido que lhes permite pressentir um desastre natural. Isto foi claramente sugerido pelo seu comportamento antes dos terramotos de Helike.
Um dos achados mais significativos feitos nas escavações de Helike foi o de pedras de calçada que teriam feito parte de uma estrada clássica. Os arqueólogos do Projecto Helike esperam agora que esta estrada os conduza para mais perto do coração da cidade antiga. No entanto, para se conseguir encontrar ruínas mais completas da cidade clássica temos de nos questionar se um tsunami tão destruidor teria deixado algo para ser encontrado pelos arqueólogos. Mesmo assim, a equipa do Projecto Helike está confiante de que uma das partes principais da cidade ainda pode ser descoberta. Alguém que apoiaria esta crença seria sem dúvida o falecido Spyridon Marinatos, descobridor da cidade pré-histórica de Akrotiri, na ilha grega de Santorini. Sendo um dos primeiros exploradores modernos da cidade perdida, Marinatos chegou a especular que imensas esculturas clássicas de mármore e de bronze poderiam estar soterradas nas ruínas da cidade, esperando mesmo pela descoberta de uma cidade antiga que ultrapassaria até a riqueza arqueológica de Pompeia.
Além do perigo constante de novos terramotos na zona, o Projecto Helike enfrenta agora uma nova ameaça no local. Em tempos romanos, uma estrada que ligava Corinto à cidade de Patras passava através de Helike. Foram encontrados na escavação indícios desta estrada. Recentemente, os caminhos-de-ferro gregos começaram a construir uma nova linha que ligaria desde 2010 Atenas a Patras. De momento, a linha está projectada para passar mesmo pelo meio do sítio das escavações, provavelmente nos próximos dois ou três anos. Assim, as ruínas da antiga Helike serão destruídas antes que as escavações consigam descobrir o que seria certamente um espólio incalculável de informação sobre a vida na Grécia clássica e pré-histórica.
De forma a evitar que este importante sítio arqueológico seja destruído pelo caminho-de-ferro, o Fundo Mundial para os Monumentos incluiu Helike na sua lista dos cem sítios em maior perigo. Contudo, os terrenos ao longo da costa, na região onde se pretende escavar, estão a ser explorados rapidamente e Dora Katsonopoulou apelou ao Ministério da Cultura da Grécia para que proibisse novas construções na zona arqueológica. Infelizmente, no presente, o Serviço Arqueológico e o Ministério da Cultura não reconheceram a importância do local. Esperemos que o valor das escavações seja reconhecido antes que seja tarde de mais e a cidade perdida de Helike não desapareça para sempre.