Bem no seio da Igreja Católica existe uma prelatura secreta e elitista, que só recentemente atraiu a atenção do grande público. É uma organização que tem a bênção e que só responde perante o Vaticano (o papa conferiu-lhe o estatuto de “prelatura pessoal” em 1982). Não se vai à sua procura. Não é preciso. Se fores um jovem católico devoto, ela vem até ti.
O Opus Dei (Obra de Deus) foi fundado em 1928 pelo padre espanhol Josemaría Escrivá. O seu objectivo era “espalhar na Sociedade uma consciência profunda do chamamento universal para a santidade e o apostolado, através do trabalho profissional levado a cabo com liberdade e responsabilidade profissional.” Mas, apesar das suas aparentes intenções nobres, o Opus Dei tem causado controvérsia mundial por causa das práticas bizarras e ditatoriais, da sua enorme riqueza e pelo culto à personalidade, que parece focar a sua energia espiritual mais no seu fundador do que em Deus.
Todos os anos, mais e mais ex-membros vêm a público contar as suas experiências pessoais de coação e manipulação: o afastamento da família e dos amigos, privação da sua liberdade intelectual, mortificações, a obediência total a superiores imperfeitos e a ameaça de condenação eterna, quando tentam deixar a organização.
Para um católico devoto, a mensagem do Opus Dei é bastante reconfortante: através da devoção à prelatura poderemos tornar-nos santos na nossa vida quotidiana. Um possível novo recruta é seleccionado e convidado a ingressar por um numerário do Opus Dei.
Na verdade, o recrutamento é a principal prioridade. Cada numerário possui sempre uma lista de 10 a 15 candidatos, com quem ele ou ela procura estabelecer amizade e recrutar. Mantêm dossiers secretos destes “amigos”e todas as semanas informam os superiores do seu progresso. A armadilha da vocação, como é conhecida nos círculos religiosos, é a mais poderosa arma de controlo de mente de um numerário. Ao potencial novo recruta são dadas evidências persuasivas da sua vocação, e, é-lhe dito que foi escolhido por Deus. Quando o recruta reconhece esta vocação, ele ou ela já terá investido tanto a nível emocional que recusar esta vocação parece um pecado mortal.
Depois de recrutado, o numerário torna-se numa espécie de monge ou freira “à civil”, cumprindo o celibato e o voto de pobreza. Se trabalharem, têm de dar todo o salário ao Opus Dei. Duas horas por dia, têm de usar um cinto de corda, chamado cilício, à volta da coxa, o que é bastante doloroso e provoca pequenos buracos do tamanho de espinhos. Têm também de usar um chicote, tipo corda, e chicotear-se uma vez por semana, além de outras pequenas mortificações como dormir no chão ou jejuar. Estar em isolamento pode parecer fora do normal, mas não necessariamente perigoso.
Contudo, no contexto mais amplo dos objectivos do Opus Dei é, acima de tudo, um forte mecanismo de controlo, concebido para subverter a sexualidade (os regimes autoritários usam sempre o impulso sexual como meio de controlo). Mais preocupante ainda é que o seu fundador era um misógino que acreditava que as mulheres necessitavam de mais disciplina para amansar as suas paixões.
A obsessão do Opus Dei em reprimir a liberdade intelectual é profundamente preocupante. Como afirma o crítico Franz Schaefer: “Na estrutura ditatorial do Opus Dei um erro ou uma má decisão de apenas uma pessoa do topo da organização pode ter consequências fatais. A resposta é algo como: “nós construímos uma ditadura, mas não se preocupem; temos um ditador tão simpático, tão amável e com tão bom coração…’ ”
Então que tipo de pessoa era o seu fundador Josemaría Escrivá? Em Abril de 1990, padres do Opus Dei apresentaram ao Papa João Paulo II informações que justificavam a beatificação e a canonização de Escrivá e que levaram o papa a descrevê-lo como “heroicamente virtuoso” (apesar do secretismo sem precedentes impedir que estranhos vejam as provas em que se baseou esta avaliação).
Em Julho do ano seguinte, uma cura milagrosa atribuída à intervenção de Escrivá foi autenticada, em parte, por peritos do Opus Dei (para uma pessoa ser canonizada é necessário existirem provas dos seus milagres).
Vários cardeais, pelo menos um dos secretários pessoais do papa e membros importantes da equipa de Relações Públicas do papa são membros do Opus Dei. Assim, não é de estranhar que a canonização de Escrivá tenha ocorrido sem sobressaltos, e que, quaisquer detalhes indesejados da sua vida privada tenham sido “enterrados”.
Agora este lucrativo culto à personalidade tem um verdadeiro santo para adorar — um incentivo poderoso para uma organização cujo lema é: “Tu também te podes tornar santo,” (desde que nos dês todo o teu dinheiro, te autoflageles diariamente, obedeças cegamente e deixes de pensar).
Depoimentos de testemunhas que conheceram Escrivá alegam que estava longe de ser santo. Na verdade, raramente atingia os níveis aceitáveis de decência humana. Maria dei Carmen Tapia, ex-supranumerária do Opus Dei, descreve-o como vaidoso, inconstante e, por vezes, grosseiramente violento. No seu livro «Uma Vida na Opus Dei» descreve a reacção de Escrivá ao descobrir que uma mulher a tinha ajudado a enviar cartas secretamente. Ele gritou furiosamente o castigo da mulher: “Levantem-lhe a saia, tirem-lhe as cuecas e dêm-lhe no traseiro!” Por si só, isto deveria ter sido suficiente para acabar com as hipóteses de se tornar santo, mas, este, como muitos outros depoimentos semelhantes, foram ignorados e desacreditados por líderes do Opus Dei.
Esta necessidade de controlar informação para obter e manter o poder está presente na rigorosa estrutura hierárquica do Opus Dei. A obediência absoluta à autoridade deve ser suprema. Um texto fundamental do livro de Escrivá («O Caminho»), que está ligado ao tema da obediência cega, sem questionar as razões, confiando que não seremos guiados a fazer algo que não seja o bem e “para glória de Deus.” No capítulo 2 repete incessantemente a mensagem de obediência a um “Director” autoritário (ele não se refere a Deus).
O correio privado dos membros, enviado e recebido, é lido e censurado. Os membros estão proibidos de ler qualquer coisa sem obter permissão dos seus directores espirituais, mesmo que seja uma leitura obrigatória do curso universitário. Os directores têm uma lista extensiva de livros censurados. Mais, o ex-numerário, Joseph Gonzalez afirma: “Eu vi numerários, incluindo directores, a queimar livros no jardim das traseiras do centro”. Normalmente, queimavam Bíblias Protestantes e teorias da evolução. “Ele também diz ter sido sujeito a “coação psicológica”, a “interpretação errada da vocação” e a “estigmatização”, quando os “directores classificaram o abandono do Opus Dei como pecado mortal.”
Numa entrevista à revista GQ* em Dezembro de 2003, Sharon Clasen, recrutada enquanto caloira na Universidade de Boston em 1981, descreve como foi afastada da família (“Agora o Opus Dei é a tua família”). Suportou todos os castigos acima mencionados e, quando tentou deixar a prelatura, foi ameaçada com a condenação ao inferno. As únicas fotos que lhe eram permitidas ter, eram as de Josemaría Escrivá.
Mundialmente existem 80.000 membros do Opus. Nos Estados Unidos são apenas 3.000, mas como o artigo da GQ realça: “Alguns dos conservadores mais conhecidos do país são simpatizantes ou amigos do Opus Dei: Antonin Scalis, Clarence Thomas, Robert Bork, os senadores Republicanos Rick Santorum e Sam Brownback, o ex-director do Information Awareness Office, John M. Poindexter, e as estrelas de TV Lawrence Kudlow e Robert Novack.”
Esta “Máfia Sagrada” continua a destruir vidas e a controlar mentes, enquanto conquista mais poder e riqueza. Recentemente, construiu uma luxuosa sede de 47 milhões de dólares, no centro de Manhattan. As fotografias do seu fundador estão em todo o lado. Um visitante seria levado a interpretar o edifício, nada mais nada menos, como uma manifestação digna de culto à personalidade do seu “santo” Josemaría Escrivá.
Fonte: Livro: «O Manual das Sociedades Secretas» de Michael Bradley