Quando as pessoas perdem um membro de carne e osso, normalmente não perdem a sensação da sua presença. Parece que continua efectivamente lá, apesar de ter deixado de ter existência material. Que tipo de realidade tem o fantasma?
Só nos Estados Unidos, há mais de 300.000 pessoas com braços ou pernas amputados, entre as quais cerca de 26.000 veteranos de Guerra. Quase todos têm Membros Fantasma, e embora alguns dos fantasmas tendam a esbater-se com o andar do tempo, raramente desaparecem por completo. Pelo contrário, em muitos casos continuam a ser uma experiência bem viva: a fonte de muitas dores. As dores fantasma doem mesmo.
Logo a seguir à amputação, o fantasma pode ser tão real que as pessoas que sofreram amputação de uma perna podem facilmente esquecer que já não a têm. Algumas chegam a dar quedas porque tentam pôr-se em pé e caminhar. Outras “vão involuntariamente com a mão coçar o pé que já não têm”. Pessoas a quem foi recentemente amputado um braço tentam muitas vezes estendê-lo para pegar no telefone ou noutros objectos.
Além de uma sensação da sua forma, posição e movimento, os amputados experimentam várias sensações no membro amputado, tais como comichões, calor e contracções. Em geral, os Membros Fantasma podem ser mexidos à vontade, e também se movimentam em coordenação com o resto do corpo. Aliás, os amputados sentem-nos como fazendo parte do corpo. Mesmo quando um pé fantasma parece balançar no ar vários centímetros abaixo do coto, continua a dar a sensação de fazer parte do corpo e move-se harmoniosamente com os outros membros e o tronco. Uma das características curiosas dos Membros Fantasma, consentânea com a sua natureza fantasmagórica, é que podem atravessar objectos sólidos como camas e mesas.
Recebi dezenas e dezenas de relatos expressivos e fascinantes de experiências com Membros Fantasma vividas por amputados. Algumas chegaram-me em resposta a um artigo que escrevi em 1991 no Bulletin ofthe Institute of Noetic Sciences (Boletim do Instituto de Ciências Noéticas); outros eram de leitores da revista Veterans of Foreign Wars (Veteranos de Guerras no Estrangeiro), na sequência de uma nota publicada no número de Abril de 1993, por amabilidade do Dr. Dixie McReynolds. O relato que a seguir se transcreve é de Herman Berg, veterano que, em 1970, sofreu a amputação de uma perna:
“Com o andar do tempo habituamo-nos às várias sensações, comichões e autênticas pontadas de “dor”, o que não impede que de vez em quando percamos a paciência e praguejemos. Além do mais, a amputação transforma-se num instrumento fiável de previsão meteorológica. Sabemos sempre quando vai haver mudança de tempo.”
“Sinto sempre a presença da perna ausente. A princípio parecia pendurada da cama ou espetada para cima. Isso parou, mas a perna continua lá. Então passam-se dias em que não notamos as sensações. Consigo controlar a mente e fazê-la dobrar os dedos dos pés, os joelhos ou o que quer que seja. Sinto-os mexer através dos nervos cortados, mas enquanto faço isso tenho uma sensação de choque ou de curto circuito. É esquisito!”
“No momento em que lhe escrevo, estou em calções sentado à secretária e o membro ausente está onde devia estar, na cadeira, e tenho uma certa sensação nos dedos do pé.”
Há muitos amputados a quem as dores atormentam de tempos a tempos, mas infelizmente os médicos pouco podem fazer, a menos que a dor seja no coto e não no próprio Membro Fantasma. Entre os métodos parcialmente eficazes contam-se as práticas de meditação e o chamado biofeedback (informação biológica de retorno, técnica que consiste em tornar perceptíveis pelos sentidos processos biológicos inconscientes ou involuntários, para permitir exercer sobre eles controlo mental consciente).
Alguns amputados procuram refúgio no álcool ou na droga. Mas muitos outros aprendem a viver com o problema, com grande coragem e força anímica. Leo Hunger, por exemplo, ficou com os dois pés seriamente estropiados por uma mina, quando em Novembro de 1944 combatia na Europa. Amputaram-lhe os dois membros inferiores do joelho para baixo.
“Desde o primeiro dia que tenho a sensação de que continuo a ter pernas e pés. A princípio tinha fortes dores fantasma, que pareciam bolas de fogo que me desciam pelas pernas e saíam pelos dedos dos pés. Passados 20 anos, raras vezes sinto a mesma coisa, mas sinto muitas vezes como se acabasse de partir os ossos, o mesmo que senti no dia do desastre. Aprendi que, se levantar as pernas, a sensação passa. Durante vários anos fui perito de acidentes da Mútua de Seguro Agrícola do Departamento de Agricultura do estado de Illinois, e quando algum trabalhador agrícola perdia uma perna numa ceifeira mecânica, coisa frequente com as ceifeiras antigas, eu ia visitá-lo muito pouco tempo depois do acidente. A primeira coisa que lhe dizia era, “Dê graças a Deus por ser um amputado, e não um inválido”. Depois tirava a perna que correspondia à que ele tinha perdido e mostrava-lhe como ficava o coto de uma amputação bem feita e como uma boa prótese o podia pôr a andar lindamente. Muitos escreveram para a minha companhia a dizer que a minha demonstração os tinha ajudado mais do que o dinheiro da indemnização.”
“Não posso correr mas fui agricultor, instalei linhas de ordenha, vendi seguros, trabalhei como perito de sinistros e fiz praticamente tudo o que queria durante quase 50 anos.”
Fonte: LIVRO: «7 Experiências que podem mudar o Mundo» de Rupert Sheldrake