A recolha e avaliação das provas dos ensaios levam muito tempo, mas os reguladores têm de equilibrar várias forças opostas. É frequente os médicos atentos à Saúde pública fazerem absolutamente questão de garantir que as provas de um novo medicamento são tão boas quanto possível, em parte porque muitos novos Medicamentos não são muito mais úteis que os já existentes, mas também porque a fase anterior à aprovação é um período onde são maiores as probabilidades de uma empresa da Indústria Farmacêutica satisfazer as exigências da investigação.
Isto pode ter efeitos preocupantes, que talvez nos levem a acreditar que a qualidade da evidência não é o único factor que influencia a aprovação de um medicamento. Durante muitas décadas, por exemplo, o desempenho da FDA era avaliado pelo número de Medicamentos que conseguia aprovar em cada ano civil. Desembocou num fenómeno conhecido pela designação de “Efeito Dezembro“, em que uma enorme proporção das aprovações do ano ocorria apressadamente, em pânico, nas últimas semanas desse mês, perto do Natal. O gráfico seguinte, que ilustra a proporção de aprovações ocorridas em Dezembro durante trinta anos (Carpenter 2010) mostra a dimensão deste efeito, e também evidencia o início de uma posição mais agressiva a favor da Indústria durante a presidência de Ronald Reagan (1981-89).
As empresas da Indústria Farmacêutica, entretanto, o que querem é comercializar o seu fármaco da forma mais rápida e menos dispendiosa. Não se trata apenas de ânsia pelos proventos, mas também de medo de os perder porque, ainda antes de se iniciar o processo de aprovação, já o relógio está a fazer tiquetaque, aproximando-se do momento em que a patente do medicamento expirará. Este forte incentivo comercial é comunicado aos governos de uma forma musculada, que pressiona os reguladores a aprovarem rapidamente e que, muitas vezes, mede a rapidez da aprovação como um resultado crucial para o regulador.
Se as aprovações se distribuíssem uniformemente ao longo do ano, esperaríamos ver apenas 8% em cada mês: em finais da década de 1980, a proporção aprovada em Dezembro aumentou para mais de metade, e é difícil acreditar que foi apenas porque as avaliações ficaram concluídas nesse mês.
Estes tipos de pressões também estão patentes no tempo de aprovação, que se reduziu grandemente em todo o mundo: nos Estados Unidos, diminuiu para metade a partir de 1993, na sequência de reduções ocorridas anteriormente, e, no Reino Unido, a redução foi ainda mais espectacular, de 154 dias úteis em 1989 para 44 dias úteis no espaço de uma década apenas.
Seria um erro imaginar que as empresas da Indústria Farmacêutica são as únicas que exercem pressão no sentido de aprovações mais rápidas. Os doentes também podem sentir que estão a ser privados do acesso a Medicamentos, sobretudo se estão desesperados. Com efeito, nas décadas de 1980 e 1990, a principal campanha pública para aprovações mais rápidas provinha de uma aliança forjada entre as empresas da Indústria Farmacêutica e activistas da sida como a ACT UP.
Nesse período, o VIH e a sida tinham surgido repentinamente do nada, e homossexuais jovens anteriormente saudáveis estavam a adoecer e a morrer em números aterradores, sem qualquer tratamento à sua disposição. Não nos interessa, explicavam, se os Medicamentos cuja eficácia está a ser testada neste momento nos podem matar: queremo-los porque, seja como for, estamos a morrer. Perder uns meses de vida porque um medicamento ainda não aprovado vinha a revelar-se perigoso não era nada em comparação com a brutal redução de uma esperança de vida normal. De uma forma extrema, a comunidade portadora de VIH estava a exemplificar as melhores motivações que levam as pessoas a participarem em ensaios clínicos: estavam preparados para correr um risco, na esperança de descobrir melhores tratamentos no futuro para si próprios ou para outras pessoas como eles. Para esse efeito, bloquearam o trânsito em Wall Street, manifestaram-se diante da sede da FDA em Rockville, Maryland, e realizaram uma campanha em prol de aprovações mais rápidas.
Em resultado destes esforços, entrou em vigor uma série de regulamentações destinadas a permitir a aprovação acelerada de certos Medicamentos novos. Esta legislação destinava-se a ser utilizada em Medicamentos que salvassem vidas, em situações em que não existisse nenhuma terapêutica disponível. Infelizmente, agora que já está em vigor há mais de uma década, podemos ver que não tem estado a ser utilizada para esse efeito.