Apresentação:
Dividocracia (2011) – em inglês Debtocracy – começa com uma premissa que haverá de ser desconstruída durante seus 74 minutos: a de que é um “documentário sobre a crise financeira mundial, europeia, grega”. Não, a crise financeira não é mundial, europeia ou grega, mas bancária.
O documentário, de produção muito qualificada, é uma das mais novas demonstrações de que a frase “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” torna-se cada vez mais verdadeira. Não que o documentário poupe em iluminação, em qualidade de gravação ou não se dê ao luxo de viajar até onde estão os factos que deseja mostrar – mas porque se isso até décadas atrás era um sonho distante, hoje se torna mais simples com câmeras de qualidade significativa domésticas e até em celulares.
Se na técnica o documentário merece elogios, em seu conteúdo demonstra imenso valor didáctico e boa argumentação. O roteiro, bem construído pela mesma dupla que assina a direcção, passa serenamente sua mensagem, viajando por Grécia, Estados Unidos, Alemanha, Argentina e Equador.
As ideias ao pouco construídas demonstram que a Grécia, como outros países da Zona do Euro e da União Europeia, notadamente Portugal, Espanha e Irlanda, só perderam com a instituição da moeda única. Isso porque a falta de câmbio facilitou o crescimento de economias mais fortes, em especial a alemã, pois não existiam mais medidas económicas internas da Grécia e destes outros países capazes de frear a entrada de produtos alemães, entre outras questões. São essas condições que dão origem ao crescimento da dívida grega, que se tornou insustentável.
É a partir daí que os directores tratarão da questão da dívida, indo pelo caminho mais lógico para o tema – lógico por escolher entender a dívida para poder enfrentá-la, e não só apresentar o “remediar” de políticos, economistas e jornalistas de plantão. É preciso, e o documentário explora isso muito bem, entender primeiramente como se chegou até a situação. Se o primeiro passo é entender a Zona do Euro e a origem privada da crise nos EUA, o documentário seguirá o caminho de explicar além disso, chegando até à América Latina.
Não por acaso o documentário chama a América Latina de “laboratório do FMI”. Foi notadamente por aqui, na América, que diversas doutrinas do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial foram testadas, ao custo dos empregos e das economias latino-americanas. O documentário cita especialmente dois países: Argentina e Equador.
A Argentina é lembrada pela sua crise, em 2001. Por um lado, mostra-se como o país foi base para as experiências dos Fundos Internacionais. Por outro lembra os protestos que se seguiram à “bancarrota”, os “panelaços” em frente à Casa Rosada e a ignóbil saída de helicóptero de Fernando De La Rúa.
O Equador, por outro lado, é exemplo. O país passou por um processo pouco comum, mas necessário não só na Grécia como também no Brasil, que é uma auditoria da dívida pública. Essa auditoria extinguiu parte considerável da dívida do país, que se mostrou não fundamentada, sendo não mais que fruto de mecanismos financeiros que impossibilitariam o seu pagamento – qualquer semelhança com o Brasil não será mera coincidência.
Portanto, Dividocracia é não só um documentário importante por tratar da crise na Europa, mas por ir além da crise para entendê-la e por propor caminhos possíveis além da verborreia financeira que julga a crise bancária uma crise global.
O documentário Dividocracia foi lançado com licença copyleft e pode ser assistido na íntegra no site de divulgação ou no Youtube.
Ficha Técnica:
- Título Original: Χρεοκρατία (Debtocracy)
- País: Grécia
- Gênero: Documentário
- Duração: 74 min.
- Áudio: grego (Legendado em PT)
- Estúdio/Distrib.: “The Press Project” / “TVXS”
- Data de Lançamento: 6 de Abril de 2011
- Director: Katerina Kitidi / Aris Chatzistefanou
- IMDB: http://www.imdb.com/title/tt1890383/?ref_=fn_al_tt_1
- Site Oficial: http://www.debtocracy.gr/indexen.html
Vídeo:
O Paradigmas adoptou uma nova política de vídeos, conforme explicado no artigo “Canal Paradigmas no Youtube reconstroi-se pela base“. Conseguimos, não obstante, encontrar o documentário, na íntegra, conforme aqui apresentado.