Em que medida é que a Ciência Normal é Paranormal?

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Ciência Normal é Paranormal
Ciência Normal é Paranormal

Existe uma boa razão para o tabu convencional contra a Parapsicologia, que faz dela uma espécie de proscrita da Ciência estabelecida. A existência de Fenómenos Psíquicos colocaria em sérios riscos a ilusão da objectividade. Levantaria a possibilidade de muitos resultados empíricos, em muitos campos da Ciência, reflectirem as expectativas dos experimentadores através de subtis influências inconscientes. Por ironia, o ideal ortodoxo da observação passiva pode proporcionar excelentes condições para efeitos paranormais:

Um experimentador que monta o seu dispositivo, prepara os seus animais e depois os deixa com uma certa sensação de segurança de que a experiência vai correr bem e os animais vão fazer bem “o que lhes compete” não pode deixar de nos trazer à ideia certos aspectos de magia, de rituais ou porventura de oração suplicante. É algo que é feito com a confiança de que irá produzir um resultado desejado, e o participante, ao fazê-lo, estabelece psicologicamente uma distância entre si próprio e o resultado. Não é que esteja a fazer com que as coisas aconteçam, mas confia em que aconteçam… Tais circunstâncias podem proporcionar a oportunidade ideal para a intervenção psicocinética.

Fenómenos de Psicocinéticos
Fenómenos de Psicocinéticos

Esta possibilidade foi mesmo levantada num artigo publicado na revista Nature sob o título “Os cientistas face ao paranormal”, da autoria do físico David Bohm e outros. Notaram eles que as condições de distensão necessárias à manifestação de fenómenos psicocinéticos são também as que mais produtivas se mostram para a investigação científica em geral. Pelo contrário, a tensão, o medo e a hostilidade não só tendem a inibir os efeitos psi mas também a influenciar as experiências das chamadas ciências duras. “Basta haver entre os participantes numa experiência física alguém que esteja tenso e hostil, e não queira verdadeiramente que a experiência resulte, para reduzir drasticamente as probabilidades de êxito.”

Os defensores da ortodoxia, de uma forma geral, rejeitam ou ignoram a possibilidade de influências paranormais, seja em que circunstâncias for. Grupos organizados de cépticos tomam a peito a missão de manter a Ciência livre de influências psi. Estes vigilantes científicos questionam sistematicamente toda e qualquer prova da existência de efeitos psi, rejeitando-a com base num ou vários dos seguintes fundamentos:

1. Experimentação incompetente.

2. Selectividade na observação, registo e apresentação dos dados.

3. Mistificação inconsciente ou consciente.

4. Efeito do experimentador induzido por indícios subtis.

Os cépticos têm razão quando apontam estas possíveis fontes de erro na investigação parapsicológica. Mas elas são as mesmas que existem na investigação ortodoxa. O simples facto de a investigação parapsicológica estar sujeita a um tão apertado crivo crítico cria nos investigadores uma consciência exacerbada dos efeitos da expectativa. Por ironia, é nos campos da investigação convencional e incontroversa que as influências das expectativas do experimentador podem mais facilmente passar despercebidas.

Hans, o cavalo inteligente
Hans, o cavalo inteligente

A existência do efeito do experimentador na medicina e nas ciências do comportamento é uma realidade inegável. E é por isso que os “indícios subtis” assumem um papel explicativo tão importante. Quase toda a gente está de acordo em que indícios subtis tais como gestos, movimentos de olhos, posição do corpo e odores podem influenciar pessoas e animais. Os cépticos fazem muita questão de salientar a importância de tais indícios, e com razão. Um exemplo a que gostam de recorrer para ilustrar a importância da comunicação subtil é a história de Hans, o cavalo inteligente, equídeo berlinense que ganhou fama no virar do Século XIX para o XX.

Na presença do dono, o cavalo era aparentemente capaz de resolver problemas de aritmética, batendo com um casco no chão para contar a resposta ao problema. Era pouco provável que se tratasse de fraude, já que o dono deixava que fossem outras pessoas a fazer a pergunta ao animal, sem cobrar nada por isso. O fenómeno foi cientificamente investigado em 1904 pelo psicólogo Oskar Pfungst, que concluiu que o cavalo recebia pistas de gestos que o dono e os outros interrogadores faziam, provavelmente sem querer. Pfungst descobriu que podia obter do cavalo a resposta correcta se concentrasse a atenção no número, embora não se apercebesse de que fazia qualquer movimento susceptível de denunciar qual era esse número.

Ninguém nega que as pessoas e os animais possam ser influenciados por indícios subtis, dados pelos experimentadores através dos canais sensoriais normais. Os cépticos defendem que tais influências podem ser a explicação para muitos exemplos de alegada comunicação telepática. Mas, mesmo que assim seja, subsiste a possibilidade de que tanto os subtis indícios sensoriais como as influências paranormais tenham um papel a desempenhar.

A história da investigação de Pfungst sobre o cavalo Hans tem passado de geração em geração de estudantes de Psicologia. O que é menos conhecido é que depois da investigação de Pfungst, descrita no livro sobre Hans, o cavalo inteligente, que publicou em 1911, novos estudos com cavalos dotados de idênticas faculdades matemáticas vieram revelar que tais faculdades não se deviam apenas a subtis indícios sensoriais. Por exemplo, quando Maurice Maeterlinck investigou os famosos cavalos calculadores de Elberfeld, chegou à conclusão de que, de uma maneira ou de outra, eles lhe liam os pensamentos, em vez de reagirem a subtis indícios sensoriais. Ao cabo de uma série de testes cada vez mais rigorosos, imaginou um que “exactamente pela sua simplicidade, não suportava qualquer tipo de suspeita elaborada ou complexa”. Pegou em três cartões em que estavam escritos números, baralhou-os sem olhar para eles e pô-los virados para baixo em cima de uma prancha, de modo a que o cavalo só lhes pudesse ver as costas, em branco. “Logo, não havia naquele momento uma única pessoa no mundo que soubesse que cartas eram aquelas.” A verdade é que, sem hesitar, o cavalo martelou no chão o número que as três cartas formavam. A mesma experiência resultou com os outros cavalos calculadores, “tantas vezes quantas eu quisesse”. Estes resultados ultrapassam mesmo a possibilidade de telepatia, dado que nem o próprio Maeterlinck sabia quais eram as respostas no momento em que os cavalos as tamborilavam no chão. O que eles sugerem é que os cavalos tinham poderes de clarividência, sabendo directamente o que estava escrito nos cartões, ou faculdades pré-cognitivas, sabendo qual era o número que Maeterlinck teria em mente quando mais tarde virasse as cartas.

Hans, o cavalo dotado com faculdades matemáticas
Hans, o cavalo dotado com faculdades matemáticas

Há mais de oitenta anos que a história do cavalo Hans e de Pfungst é contada e recontada como um triunfo do cepticismo. Assumiu um significado mítico, ao permitir que fenómenos aparentemente paranormais sejam explicados como indícios subtis. Mas porque é que alguns desses indícios subtis não hão-de ser paranormais? A mera discussão de tal possibilidade esbarra com um tabu, pelo que nem vale a pena falar na sua investigação. Mas a possível importância das influências parapsicológicas foi sugerida a Rosenthal por um dos seus colegas de Harvard, logo no início da sua investigação sobre o efeito do experimentador:

“Tivesse eu tido bom senso ou coragem, e podia facilmente ter feito um estudo em que vedasse aos experimentadores com expectativas variadas quanto às respostas dos seus sujeitos o contacto sensorial com esses sujeitos. O meu prognóstico, então como agora, era (e continua a ser) que nessas condições não se verificaria qualquer efeito de expectativa. Mas nunca fiz o estudo.”

Se alguém fizesse efectivamente o estudo, talvez o prognóstico de Rosenthal se revelasse errado. Talvez alguns dos efeitos da expectativa do experimentador sejam de facto paranormais. Tais influências subtis, a existirem, não obstariam aos indícios subtis; normalmente convergiriam com eles no mesmo sentido, e actuariam inconscientemente, como eles.

Apesar de, no campo da medicina e das ciências do comportamento, o efeito do experimentador ser amplamente reconhecido, o facto de ele ser explicado – ou negado – como sendo resultado de “indícios subtis” impede que seja levado muito a sério noutros campos de investigação, como a bioquímica. Se há a possibilidade de um rato ou uma pessoa detectar as expectativas de um cientista e responder-lhe de acordo com essas expectativas, já não é de esperar que uma enzima dentro de um tubo de ensaio reaja à subtil linguagem corporal, a gestos faciais inconscientes, etc. Claro que ninguém discute a possibilidade de uma observação condicionada, mas esse condicionamento não é resultante de qualquer influência concreta sobre o próprio sistema experimental. O cientista pode “ver” uma diferença que vai ao encontro da sua expectativa, mas considera-se que essa diferença só existe aos olhos do observador e não no material estudado.

Mas tudo isto são meras hipóteses. Não existe praticamente investigação sobre a influência das expectativas do experimentador em campos científicos como a agricultura, a genética, a biologia molecular, a química e a física. Como se parte do princípio de que o material estudado é imune a tais influências, parte-se também do princípio de que não é necessário tomar precauções. Raramente se fazem testes com dupla ocultação, a não ser nas ciências do comportamento e na investigação clínica.

Fonte: LIVRO: «7 Experiências que podem mudar o Mundo» de Rupert Sheldrake

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