Para alcançar e manter os seus enormes lucros (em detrimento dos serviços de saúde públicos), recorrem em muitos casos à colocação em postos políticos e governamentais de pessoas afins aos seus interesses ou directores das suas empresas.
Patentes comerciais
Uma estratégia que aumentou o poder político e económico das grandes Empresas Farmacêuticas norte-americanas foi a lei de extensão de patentes (Lei Hatch-Waxman) aprovada por Reagan em 1984, (até essa data a Política de patentes não afectava os Medicamentos por considerá-los um bem necessário). Esta medida estendeu-se posteriormente ao resto do mundo graças à criação da Organização Mundial do Comércio (OMC) em 1994, que garante que a globalização não afecta os interesses do grande capital multinacional. Agora 60% das patentes de Medicamentos são dos EUA, face a 20% da União Europeia. Graças a isto os EUA dominam o mercado dos 50 Medicamentos mais vendidos.
Problemas associados às patentes de medicamentos:
- Dificultam o acesso aos cuidados de Saúde e à disponibilidade de Medicamentos essenciais a grande parte da população pelo seu elevado custo que é fixado abusivamente pelos laboratórios;
- Favorece os interesses industriais em detrimento da maioria da população. O caso do tratamento da Hepatite C com Sovaldi a um preço brutal é um exemplo paradigmático;
- Impossibilita uma autêntica concorrência;
- São injustas com os países subdesenvolvidos.
Os Estados Unidos concedem isenções e reduções de impostos e incorporam nos tratados internacionais de livre comércio (como o que actualmente está a ser negociado com a União Europeia – TTIP) medidas que favorecem a Indústria Farmacêutica, o que demonstra que os seus lucros não são fruto do livre mercado mas de uma Política de protecção desta Indústria nos EUA. Esta estratégia é similar à aplicada agora pela União Europeia que protege os seus laboratórios com medidas como não contemplar critérios económicos na hora de autorizar um novo fármaco ou responder à fabricação do sofosfovir (Sovaldi) para a Hepatite C como genérico pelo laboratório GVK da Índia com base em que não era uma patente nova ao ser utilizado desde há anos como antiviral no tratamento do HIV retirando a autorização de 700 fármacos genéricos deste laboratório nos países da UE, o que pressupõe uma represália comercial que afecta os doentes europeus.
O principal argumento para manter as patentes dos Medicamentos está nos gastos na investigação de novos Medicamentos, no entanto a maior parte do custo da investigação de um novo fármaco não recai sobre a Indústria já que os governos e os consumidores financiam 84% da investigação, enquanto que apenas 12% corresponde aos laboratórios farmacêuticos. Também não é verdadeiro o outro argumento de que para criar um novo fármaco é necessário investir mais de 800 milhões de dólares em investigação. Um estudo, que reuniu dados de 117 projetos de investigação, reduziu o custo a 75 ou 80 milhões de dólares, outro artigo do British Medical Journal assinalava em 2012 que face à informação da Indústria, de que a investigação de um novo medicamento tem um custo de 1.300 milhões de dólares, a realidade é que o custo médio se situava em 60 milhões de dólares. Esta situação de monopólio explica os elevadíssimos custos dos novos Medicamentos, que não se justificam nem pelos seus custos de produção nem pelos investimentos realizados na investigação. Por outro lado, uma parte importante das novas investigações é feita com dinheiro público, mas as patentes acabam em mãos privadas, um bom exemplo de como a chamada “colaboração público – privada” não é senão dinheiro público para lucros privados.
Segundo a FDA norte-americana (organismo que autoriza a venda de medicamentos), só 20% do investimento em investigação foi parar a produtos que contribuem para uma melhoria terapêutica notável.
Aumentar o preço dos medicamentos
A Indústria argumenta com a necessidade de fixar um elevado preço pelos custos para investigar e fabricar moléculas, cada vez mais complicadas que exigem investimento e aparelhos muito caros. Na realidade, o incremento dos custos não está relacionado com o fabrico dos Medicamentos, nem no investimento em investigação e desenvolvimento, mas nas despesas associadas à comercialização e à promoção dos seus produtos. Enquanto a investigação e desenvolvimento dos fármacos recebe cerca de 13% do orçamento, as despesas de marketing significam entre 30-35% do orçamento dos laboratórios, isto é gastam o dobro em promoção do que gastam em investigação, o artigo antes citado do BMJ assinalava que por cada dólar dedicado à investigação se gastam 19 em promoção.
Por outro lado, os custos de fabrico diminuíram de maneira importante, devido ao emprego de aparelhos e processos industriais mais eficientes, à automação de muitas fases produtivas e à redução de mão-de-obra (as grandes fusões das principais Empresas Farmacêuticas dos anos 90 provocaram dezenas de milhares de despedimentos). Os custos são a consequência da realização de estudos de mercado, análise de concorrentes, extensão de patentes, distribuição, promoção, publicidade e vendas dos seus produtos, despesas administrativas para manter estruturas multinacionais e os astronómicos salários pagos aos seus executivos.
Pouca inovação nos novos fármacos apesar do seu elevado custo
Menos de 25% dos novos Medicamentos que são postos no mercado são inovadores ou melhoram os resultados dos anteriores (cujos preços são muito menores e estão suficientemente provados em qualidade e segurança). Desgraçadamente, os organismos governamentais que deveriam controlar esta situação em benefício dos cidadãos são financiados pela Indústria. Assim a FDA dos Estados Unidos é financiada em 75% ou a Agência Europeia de Avaliação de Medicamentos em 80% pelas multinacionais Farmacêuticas.
Pouca transparência e frequente manipulação dos dados
A Indústria é muito pouco transparente e com muita frequência dá informação manipulada (tendenciosa, dito de maneira elegante). Um bom exemplo é o caso do oseltamivir (® Tamiflu) do qual, ante o alarme da Gripe A (H1N1), se realizaram grandes compras em quase todo mundo e que depois se descobriu que os ensaios clínicos, que apresentava a empresa que o comercializou, tinham sido convenientemente “maquilhados” para melhorar os seus resultados, além de que há muitos exemplos de ocultação dos efeitos adversos. Por outro lado e com frequência apresentam-se ensaios clínicos em que se utiliza a nova droga em comparação com um placebo, em vez de compará-la com outros tratamentos eficazes já existentes, com o que se cria uma falsa imagem de bons resultados quando a realidade é que praticamente não se modifica o efeito.
Estratégias para aumentar a venda de medicamentos
A Indústria confronta-se, desde há alguns anos com as políticas dos governos de reduzir o custo dos Medicamentos que representam uma proporção cada vez maior dos orçamentos estatais (no estado espanhol atinge entre 25-30% da despesa em Saúde total, o que põe em risco a sustentabilidade do sistema público), com medidas como a redução de preços, preços de referência para grupos de Medicamentos similares ou a promoção de genéricos.
Para fazer frente a esta diminuição de lucros os laboratórios estão a pôr em prática diferentes medidas:
- Redefinir e incrementar a prevalência de determinadas doenças. Há relatórios que assinalam que a disfunção sexual feminina atinge 43% do total;
- Promover o tratamento de problemas leves ou de média gravidade como indícios de doenças mais graves. Síndrome do cólon irritável ou transtornos de ansiedade;
- Transformar os riscos para a Saúde em doenças. A osteoporose ou a síndrome de défice de testosterona;
- Estimular a preocupação sobre futuras doenças em populações sãs. A osteopenia ou o Alzheimer;
- Converter os problemas pessoais e sociais em problemas de Saúde diagnosticáveis e com necessidade de tratamento. Converter a timidez em fobia social;
- Considerar certas doenças como epidemias de extraordinária propagação e letalidade. A Gripe A que foi uma gripe mais suave que a gripe sazonal promoveu a aplicação de protocolos estritos (com o uso de fatos próprios e áreas de isolamento, o emprego de antivirais como o Tamiflu de eficácia não provada e a promoção em massa da vacina).
Até há pouco, era frequente que as grandes empresas Farmacêuticas pagassem subornos aos médicos para receitarem os seus Medicamentos, ainda que seja uma prática que geralmente é mal vista e em muitos lugares é ilegal. Com o aumento dos controlos sobre os médicos prescritores os laboratórios estão a desenvolver uma estratégia para apoiar economicamente, organizar congressos e reuniões com organizações de doentes para procurar o apoio destes para que pressionem os governos para o financiamento de determinados fármacos, ainda que não esteja justificada a sua necessidade ou tenham efeitos adversos.
Os novos medicamentos aumentarão a desigualdade na saúde
A Indústria Farmacêutica converteu a doença num negócio. A globalização permitiu estender o seu poder pelo que decidem que doenças e daí doentes merecem cura. 90% do orçamento dedicado pelas Farmacêuticas à investigação e ao desenvolvimento de novos Medicamentos está destinado a doenças de que padecem 10% da população mundial (cancro, artrose, diabetes, transtornos de lípidos, hipertensão, etc).
Atualmente a empresa farmacêutica Gilead está a ganhar enormes lucros graças ao tratamento contra a Hepatite C, sofosfovir ao qual deu um preço astronómico, parece que 25.000 euros no estado espanhol e 80.000 dólares nos EUA.
A descoberta da estrutura do DNA e a biotecnologia produzem novos fármacos (prostaglandinas, interferão, novas vacinas, o factor de coagulação sanguínea e muitos outros compostos bioquímicos complexos) que antes eram difíceis ou impossíveis de fabricar. A engenharia genética permite o desenvolvimento de novos fármacos de elevadíssimo custo que os próprios laboratórios consideram que não vão poder ser utilizados por toda a população, mas que vão encarecer o custo dos serviços de Saúde cada vez mais inacessíveis para a maioria da população. Na actualidade mais de 2.000 milhões de pessoas veem-se privadas do seu direito à Saúde.
Fonte: Federación de Asociacones para la Defensa de la Sanidad Pública