Segundo a lógica a feroz perseguição aos gatos incitada pela Igreja Católica, dizimando quase por completo a população europeia destes animais no Século XIV, contribuiu decisivamente para a multiplicação de ratos, que eram portadores da Peste Bubónica. A terrível consequência disso foi a proliferação da Peste Negra (Peste Bubónica), que dizimou um terço da população europeia (de 1347 a 1350). A peste era causada pela bactéria Yersinia pestis, residente no pulga Xenopsylla cheopis que por sua vez habitava no rato preto indiano Rattus rattus. Esta espécie de rato originária da Ásia, foi trazida pela horda de guerreiros mongóis liderados por Gengis Khan, na sua imparável jornada de conquistas que teve como derradeiro destino a Europa.
O número de gatos foi recuperando, e estes ainda chegaram a ter papel activo no controlo das populações de ratos, o que veio a contribuir também para a diminuição da ocorrência da peste.
Não obstante e apesar disso, a perseguição aos gatos continuou ao longo dos séculos seguintes…
A perseguição aos Gatos
A Igreja Católica foi a maior perseguidora de gatos da história, e na Idade Média, travou uma dura e longa cruzada contra os gatos e os seus admiradores. No ano 1232, o Papa Gregório IX fundou a Santa Inquisição, que actuou barbaramente durante seis séculos, torturando e executando, principalmente na fogueira, mais de um milhão de pessoas, sobretudo mulheres, homossexuais, hereges, judeus e muçulmanos. Igualmente médicos, cientistas e intelectuais, e… também os gatos, “ad majorem gloriam Dei”.
O Papa Gregório IX afirmava na bula Vox in Roma que o diabólico gato preto, “cor do mal e da vergonha”, havia caído das nuvens para a infelicidade dos homens. Para acabar com a resistência dos celtas ao Catolicismo, a Igreja Católica pregava que os sacerdotes druidas eram bruxos. Como os druidas viviam isolados e rodeados por muitos gatos, a Igreja começou a associar os gatos às trevas, devido aos seus hábitos noctívagos, e afirmava terem parte com o demónio, principalmente os de cor preta. Milhares de pessoas foram obrigadas a confessar, sob tortura, que haviam venerado o demónio em forma de gato preto, sendo logo depois, condenadas à morte.
A mesma perseguição foi realizada no Século XV, contra os povos germânicos do vale do Reno, adoradores da Deusa Freya, uma divindade pagã, sendo que a Igreja considerava o seu culto um acto de heresia, associando-o à adoração de maus espíritos. Foram destruídas imagens da Deusa e mulheres que tinham gatos foram torturadas e queimadas vivas. Os gatos, que eram protegidos pela Deusa Freya, foram acusados de serem demoníacos, capturados, enforcados, e jogados nas fogueiras da Santa Inquisição.
A tradição mágica e outras habilidades naturais sobreviviam em alguns locais, durante a Idade Média, mas eram não-oficiais e eficazmente perseguidas pela Igreja, cuja religião monoteísta tornar-se-ia um instrumento institucionalizado do Estado. A magia tornou-se uma actividade suprimida simplesmente porque os sacerdotes da Igreja não eram adeptos da mesma, e também por não quererem correr o risco de que alguém pudesse sobrepujar as suas habilidades limitadas, e o facto de serem considerados a via única para Deus. Desta forma, tudo o que a Igreja considerava “não ideal”, seria identificado na forma de várias imagens do Diabo.
Nos séculos em que a Inquisição agiu na Europa e América, uma pessoa que fosse vista com um gato, principalmente os de cor preta, estava sujeita a ser denunciada como praticante de actos de bruxaria e sofrer tortura e morte, sem nenhum direito de defesa. Uma vez acusado de bruxaria, a pessoa podia ser acusada pela responsabilidade de qualquer desgraça natural, como perda de safras, acidentes, doenças e mortes. No imaginário medieval, o gato preto tornava-se mais uma figura mística, fruto da ignorância, associada ao culto ao demónio.
Em 1484, o Papa Inocêncio VIII promulgou uma bula contra os feiticeiros, acusando de heresia milhares de pessoas, um bom número das quais sendo culpadas apenas por possuírem um gato. Por toda a Europa, milhares de pessoas inocentes foram torturadas em nome de Deus, por serem acusadas de feitiçaria e adoração a Satanás. E juntamente com elas, os seus gatos. Este Papa inquisidor incluiu o gato na lista dos perseguidos pela inquisição, campanha assassina da Igreja contra supostas heresias e bruxarias. Nesta mesma época, Leonardo da Vinci escreveu: “chegará o dia em que um crime contra um animal será considerado um crime contra a humanidade.” Leonardo era um admirador de gatos, e considerava “o menor dos felinos” uma obra-prima.
Em toda a Europa, o Dia de Todos os Santos passou a ser comemorado, acrescentado-se às actividades típicas do mesmo, o arremesso para as fogueiras de sacos cheios de gatos vivos. Em Metz, na França, todos os anos, durante 4 séculos, no culto a São Vito, foram queimados vivos, 13 gatos presos numa gaiola. Em Ypres, também na França, centenas de gatos eram atirados do alto de um campanário num festival religioso. Durante séculos, milhares de gatos foram sacrificados em rituais durante a Páscoa. Estas práticas, incitadas pela Igreja, acabaram por se estender a qualquer tipo de comemoração religiosa, como a noite de São João e de outros Santos.
Na coroação da rainha Elizabeth I, centenas de gatos foram aprisionados e levados em procissão, representando o demónio sob o controle da Igreja, e no final do ritual, acabariam todos por ser queimados vivos. Na Inglaterra elizabeteana, era comum que os gatos fossem colocados em sacos de couro e usados como alvos para os arqueiros. Desta e de outras formas, o homem descarregava nos animais, todos os seus complexos e crueldades.
Com todo o cuidado para não ser queimado vivo como herege, o navegador genovês Cristovão Colombo tomou a precaução de embarcar nas suas três caravelas, Santa Maria, Pinta e Niña, dezenas de gatos, os quais, ao longo de 35 dias de viagem transatlântica, travaram verdadeiras batalhas contra os ratos, protegendo as provisões alimentícias e permitindo que os membros da tripulação desembarcassem vivos nas margens desconhecidas, em 12 de Outubro de 1492.
No Século XVII, período conhecido como o da “caça às bruxas”, a Inquisição agiu fervorosamente em toda a Europa e América. Mulheres idosas e solitárias, que possuíam um gato como companhia, eram acusadas de bruxaria, torturadas até que confessassem aquilo que a Igreja queria, sendo então condenadas à morte, queimadas vivas em público, e seus bens imediatamente roubados pela Igreja. O julgamento das “bruxas de Salem”, em Massachussetts, é um dos principais registos deste período negro da história dos Estados Unidos.
Mesmo nestes tempos de tanto ódio, os gatos foram amados em alguns países, como na Rússia, onde eram comuns serem encontrados em conventos e mosteiros. Com o tempo, a Igreja também foi sendo mais tolerante à presença do gato, e a perseguição aos felinos foi diminuindo. O Cardeal Richelieu chegou a ter muitos gatos, entre eles um Angorá preto chamado Lúcifer.
No Século XVIII, foram finalmente abolidas as leis sobre feitiçaria.
Fontes:
- Engles, Donald W. (21 de Junho de 2001). “Appendix III: Pope Gregory and the Vox in Rama“. Classical Cats: The Rise and Fall of the Sacred Cat. Routledge; New edition. ISBN 0415261627.
- “The History of Human-Animal Interaction – The Medieval Period – Animals, Cats, Europe, and Ages“. Libraryindex.com. Retrieved 2012-05-06.
Incrível reportagem. Vou usar algumas informações para minha próxima postagem – e os créditos, claro, estarão lá. 🙂
Obrigado pelo elogio, amigo Gustavo 🙂 Gratos por podermos contribuir.
Gostei muito do texto, mas senti falta das fontes ao final.
Caso ainda as tenha, por favor, inclua ao final do texto.
Att.
Alexandre B.
Amigo Alenxandre B,
O texto foi produzido através do conhecimento adquirido ao longo dos tempos, através da leitura e confirmação de várias fontes e livros.
Agradecemos a sua colaboração e já procedemos efectivamente à introdução de algumas fontes no artigo.
Estaremos mais atentos a este aspecto no futuro.
Cumprimentos.
Gregório IX teve o pontificado antes da Peste Negra se instalar. A Igreja não fez metade das asneiras que este site disse. Meus queridos, se querem falar, estudem. E não estudem os livros didáticos e nem na internet (porque, como já disse, só falam asneira). Estude documentos de historiadores sérios, e para falar sobre idade média com propriedade leia o livro “Para Entender a Inquisição” do Prof Felipe Aquino. Se quiser se aprofundar, leia as atas do simpósio Vaticano realizado em 1998 por São João Paulo II, com os 30 maiores historiadores do mundo ao qual estudaram profundamente os documentos do Santo Ofício. Deixem de ser servos de Satanás e espalhar mentiras que não se tem fundamentos históricos. Se querem contar algo que não contaram, fala sobre o primeiro documento sobre educação que foi a Igreja que criou, fale sobre a cultura ocidental que a Igreja preservou, da defesa do ocidente contra os povos bárbaros que ameaçavam destruir nossa civilização, fale sobre os avanços médicos, as universidades, tudo que a Igreja sustenta hoje para manter os marginalizados com dignidade, falem sobre a Idade da Luz, falem a verdade sobre a Idade Média. Deus os abençoe e que vcs possam ser servos da Verdade anunciada em Cristo Senhor.
Amigo Gabriel,
Você baseia-se nas fontes fornecidas pela própria Igreja Católica?
E a que “preservação da cultura ocidental” é que se refere? Talvez ao Index Librorum Prohibitorum, promovendo a queima de todos os livros que não fossem aceites pela própria Igreja Católica? Ou à transformação de todos os ritos pagãos em santos católicos?
Cumprimentos.
Como historiador apenas reafirmo a posição de Paradigma da Matrix… A história se faz com confronto de fonte e não somente com aquelas que defendem apenas uma visão dos fatos.