Machu Picchu: a cidade perdida dos Incas

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Machu Picchu, também chamada
Machu Picchu, também chamada "cidade perdida dos Incas"

Este é provavelmente o mais espectacular sítio arqueológico da América do Sul e o símbolo mais famoso dos Incas. Machu Picchu (Velho Pico) está localizado numa área semitropical a dois mil e cem metros acima do nível do mar, nas montanhas dos Andes, no Peru. Encontra-se a quatrocentos e oitenta quilómetros a sudeste de Lima, a moderna capital peruana, e duzentos e setenta a noroeste de Cuzco, a cidade capital do império inca. Este vasto império durou entre 1438 e 1533 e localizava-se onde agora está o Peru mas também abrangia o Equador, a Bolívia, o Chile, parte da Argentina e o Sul da Colômbia. Os Incas foram a última das sociedades nativas avançadas a viver nos Andes antes da chegada dos Europeus.

Machu Picchu era conhecida apenas por alguns agricultores locais até ser re-descoberta em 1911 por Hiram Bingham, director da expedição ao Peru da Universidade de Yale. Bingham foi levado ao local por um agricultor da zona chamado Melchior Arteaga e de início o norte-americano pensou que ele e a sua equipa tinham descoberto uma outra cidade perdida dos Incas chamada Vilcabamba. Bingham tinha lido sobre Vilcabamba em crónicas espanholas do Século XVI, em que era mencionada como a cidade para onde os Incas fugiram após terem falhado a sua rebelião contra os espanhóis. A equipa de Bingham ficou surpreendida com o excelente estado de conservação da cidade, quatrocentos anos após ter sido misteriosamente abandonada pelos seus habitantes. Hiram Bingham foi o primeiro a descrever Machu Picchu como «a cidade perdida dos Incas» e utilizou-a como título do seu primeiro livro, um best-seller que tornou o local conhecido internacionalmente. A cidade perdida teve ainda mais exposição em 1913, quando a National Geographic Society dedicou toda a sua edição de Abril a este local.

Machu Picchu
Machu Picchu

Machu Picchu foi construída entre 1460 e 1470 pelo governante e fundador do império inca, Pachacuti Inca Yupanqui, e parece ter sido habitada mesmo até a aos espanhóis terem conquistado o Peru, em 1532. A cidade, com aproximadamente duzentos edifícios (habitações, palácios, templos, observatórios e estruturas de armazenamento), é um feito espantoso de planeamento urbano, engenharia civil e arquitectura. O complexo cobre uma área com cerca de mil e trezentos metros quadrados e em traços gerais pode ser dividida em três áreas distintas – agrícola, urbana e religiosa. A secção agrícola dispõe de uma série de socalcos e aquedutos que utilizam as encostas naturais do terreno, funcionando não só como plataformas de cultivo como também enquanto paredes de retenção que evitam a erosão. A área também conta com pequenas e humildes habitações construídas em becos estreitos, que teriam sido ocupadas pelos agricultores. A secção urbana do complexo está separada da agrícola por um muro. Na parte sul desta área encontra-se uma série de reentrâncias esculpidas na rocha, que foram denominadas como «a prisão» por Bingham, devido a uns pequenos nichos onde ele pensava que os braços dos detidos eram presos por anéis de pedra. Hoje em dia essa zona foi identificada mais correctamente como fazendo parte do Templo do Condor, nome que tem origem no que se pensa ser um condor dos Andes esculpido numa saliência granítica, localizada no seu ponto mais baixo. A colecção de estruturas sofisticadas próximas do templo, construídas em pedra avermelhada, é conhecida como os Aposentos dos Intelectuais, onde parecem ter sido as habitações dos amautas (professores de alto escalão), e também uma secção conhecida como a zona das mistas (princesas).

A secção religiosa contém exemplos esplêndidos de arquitectura e alvenaria incas. A sua secção principal consiste numa Praça Sagrada, o local de cerimónias populares que rodeia os edifícios mais significativos de Machu Picchu. O Templo do Sol é uma construção semicircular escavada na rocha maciça e tem duas janelas, uma virada para leste e outra para norte. De acordo com os cientistas modernos, estas janelas eram utilizadas como observatório solar; a janela oriental permitia uma medição precisa do solstício de Inverno, através da observação da sombra projectada pela pedra central.

Machu Picchu
Machu Picchu

O Templo das Três Janelas, assim chamado devido às três grandes janelas trapezoidais que abrem para a praça principal, tem no seu interior uma pedra esculpida com figuras que simbolizam os três níveis do mundo andino: o Hanan-Pacha (o mundo mais elevado, ou paraíso celestial), o Kay-Pacha (o mundo terreno) e o Ukju-Pacha (o mundo interior onde vivem os deuses). A secção religiosa também inclui o Templo Sagrado, um excelente exemplo de alvenaria inca, com grandes blocos polidos de pedra que encaixam perfeitamente, a Casa dos Sacerdotes é um santuário enigmático conhecido como Intihuatana. Esta é uma das mais importantes e misteriosas construções de Machu Picchu. E composta por uma coluna de granito, provavelmente o ponteiro de um relógio solar, que sobressai da enorme pedra piramidal e pensa-se que funcionou como um observatório solar. Em cada solstício de Inverno, durante o Festival de Inti Raymi (ou Festival do Sol), o deus era simbolicamente preso à pedra por um sacerdote, numa tentativa de impedir que o Sol desaparecesse por completo.

A principal característica de Machu Picchu, e que espantou inúmeros visitantes, é a grande qualidade dos enormes muros e edifícios de pedra, construídos sem argamassa e sem a utilização da roda nem de animais de carga. Muitos dos característicos polígonos de pedra nestas estruturas encaixam de forma tão precisa que é impossível introduzir uma lâmina finíssima entre as juntas. Esta concepção inca assegura a estabilidade numa área bem conhecida pela sua actividade sísmica. Devido à grande qualidade do trabalho de alvenaria e à aparente dificuldade com que as enormes pedras seriam transportadas e erigidas, alguns teóricos alternativos conjecturaram que foi empregue tecnologia laser na construção das estruturas de Machu Picchu, quer por alguma civilização perdida quer por visitantes extraterrestres. O mistério da construção de Machu Picchu é adensado pela falta de quaisquer provas documentais que indiquem exactamente como foram erigidos os edifícios. Investigações demonstraram que os Incas tinham uma classe de arquitectos profissionais para conceberem e organizarem a construção de tais complexos como o de Machu Picchu. Quando consideramos a arquitectura inca é vital perceber que estes arquitectos eram peritos em adaptar a forma das construções à paisagem. Assim, as formações rochosas já existentes foram aproveitadas na construção, escavaram esculturas em encostas rochosas e a água fluía por canais de pedra. Apesar de não sabermos como transportaram blocos de pedra tão grandes, a crença geral é que foram utilizados todos os homens saudáveis de tribos capturadas para empurrarem as pedras, talvez depois de as colocarem sobre pedras esféricas mais pequenas, para depois as fazerem rolar tirando as esferas de trás para a frente à medida que progrediam. A maioria dos edifícios e dos muros foi construída com blocos de granito, que foram possivelmente cortados com ferramentas de bronze ou de pedra, sendo por fim alisados com areia.

Machu Picchu
Ruínas de Machu Picchu

A função principal de Machu Picchu tem sido alvo de aceso debate. Teria sido uma grande cidade inca com uma população florescente e numerosa? Provavelmente não. Calculou-se que apenas um máximo de mil pessoas terão vivido em Machu Picchu e na área envolvente, que por ser tão isolada não pode ter sido uma cidade convencional. As escavações de Hiram Bingham, no início do Século XX, revelaram cento e trinta e cinco corpos mumificados, cento e nove dos quais foram identificados por ele como sendo de mulheres. A partir dos túmulos predominantemente femininos, Bingham deduziu que o local funcionava principalmente como um refúgio das Adias, as virgens do Sol incas. Contudo, uma análise mais recente dos esqueletos revelou que estes eram afinal tanto de homens como de mulheres em número quase igual. A teoria corrente é que o complexo era uma cidade cerimonial que também funcionava como residência real, retiro ou santuário religioso, para a realeza e os sacerdotes e sacerdotisas incas.

O abandono repentino de Machu Picchu está envolvido em mistério. Durante o período da conquista espanhola a cidade sagrada permaneceu oculta, o que sugere que havia sido abandonada e esquecida. As teorias para o abandono inexplicável da cidade são muitas, como por exemplo um longo período de seca que havia deixado a cidade sem água, um incêndio desastroso ou uma evacuação durante a época da resistência inca à invasão espanhola. A teoria mais viável é provavelmente a que aponta para o facto de que, antes da conquista, os europeus tinham trazido a varíola para o Peru; em pouco tempo assumiu proporções epidémicas e espalhou-se pelo país. Por volta de 1527, metade da população havia sucumbido à doença, o governo começara a ruir e rebentou uma guerra civil. A falta de ordem social e uma população drasticamente reduzida explicariam um abandono tão repentino.

Hoje, este espantoso complexo de templos, muros, campos e socalcos no topo de uma montanha foi tornado num santuário histórico nacional pelo governo peruano e, desde 1983, Património Mundial da UNESCO. A cidade perdida dos Incas já não está perdida, atrai cerca de quinhentos mil visitantes estrangeiros todos os anos e é de longe a maior atracção turística do Peru. Apesar de o governo peruano afirmar que não há qualquer problema relacionado com tão grande número de turistas a caminhar por todo o lado, a UNESCO exprimiu receios acerca de possíveis danos causados por este afluxo do turistas, e em 1998 adicionou Machu Picchu à lista de património mundial em risco. Infelizmente, nos últimos anos Machu Picchu envolveu-se numa controvérsia indesejada. Durante as filmagens de um anúncio publicitário de uma marca de cerveja, em Setembro de 2000, no Intihuatana, onde outrora sacerdotes e sacerdotisas incas adoravam o Sol, uma grua de quinhentos quilos caiu e partiu um grande pedaço do relógio solar, o que resultou na apresentação de uma queixa-crime contra a empresa de produção por parte de Gustavo Manrique, do Instituto Nacional da Cultura. Em 2005, o ano em que Machu Picchu foi geminada com a antiga cidade de Petra, na Jordânia, o Peru deu início a uma batalha legal para a devolução de milhares de artefactos que foram retirados do local por Hiram Bingham noventa anos antes.

Fonte: Livro «História Oculta» de Brian Haughton

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