O fluxo de ex-políticos para o universo empresarial não se limita às cotadas no índice PSI 20 – cuja constituição, aliás, não é estática. E tal como há empresas que vão entrando e saindo do PSI 20, também há administradores que vão trocando de lugares, qual jogo das cadeiras. Trata-se de um fenómeno dinâmico, com ramificações quase infindáveis, por entre sucessivas entradas e saídas, trocas de lugares e acumulação de funções e cargos em diversas empresas. O que exige uma permanente actualização dos dados e impossibilita a captação de um retrato integral, pelo que são seleccionados apenas os casos mais emblemáticos.
Desde logo o de Joaquim Ferreira do Amaral que, além do cargo que ocupa na Semapa, acumula as funções de presidente dos conselhos de administração da Lusoponte e da LVT – Lisboa Vista do Tejo. Ora, enquanto ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (1990-1995), Ferreira do Amaral tomou decisões directamente relacionadas com a mesma Lusoponte que passou a administrar em 2005, entre as quais se destacam a concessão do projecto, construção, financiamento e exploração da segunda travessia – Ponte Vasco da Gama – sobre o rio Tejo. O contrato firmado com a Lusoponte, em 1994, também outorgou à empresa a receita da cobrança de portagens na ponte 25 de Abril e o direito de exclusividade em relação a futuras travessias no rio Tejo a jusante da ponte de Vila Franca de Xira.
“Questionado sobre o facto de ter negociado o contrato com a Lusoponte enquanto ministro e estar agora à frente da empresa, Ferreira do Amaral disse estar “completamente confortável” com a situação. “Esta polémica não tem nenhuma razão de ser. Se a regra é nunca entrar numa empresa com quem assinou um contrato, devo dizer que assinei milhares de contratos, e com todas as empresas. E a lei determina, e bem, uma quarentena de três anos. Aqui passaram 12”, alega.”
Carlos Horta e Costa – ex-secretário-geral do PSD (1997-1998) – coincidiu com Ferreira do Amaral no Conselho de Administração da Semapa entre 2006 e 2012. Não foi a primeira vez que os destinos de ambos se cruzaram. Também estiveram juntos na Comissão Política Nacional do PSD, entre 1996 e 1999, durante a liderança de Marcelo Rebelo de Sousa. Mais, quando Horta e Costa assumiu pela primeira vez a presidência dos CTT, em 1995, a empresa funcionava sob a tutela do então ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações – o próprio Ferreira do Amaral.
A saída de Horta e Costa da Semapa, em 2012, poderá ter sido motivada pela acusação de crimes de participação económica em negócio e gestão danosa que pende sobre o ex-presidente dos CTT. Em conjunto com outros dez arguidos, Horta e Costa começou a ser julgado no Tribunal de Coimbra no dia 26 de Novembro de 2012, devido a actos de gestão que, segundo a acusação do Ministério Público, terão lesado a empresa em cerca de 13,5 milhões de euros.
Com destaque para a venda de um edifício dos CTT, síto em Coimbra, no dia 20 de Março de 2003, por 14,8 milhões de euros à empresa Demagre. Nesse mesmo dia, a Demagre revendeu o edifício por 20 milhões de euros à ESAF – Espírito Santo Activos Financeiros, obtendo uma mais-valia instantânea de 5,2 milhões de euros. “As escrituras foram feitas uma a seguir à outra no Cartório Notarial de Alcobaça e, logo a seguir, no mesmo dia, os gerentes da Demagre levantaram 1 milhão de euros em notas de 500 no banco ao lado, que os investigadores concluíram terem sido para luvas.”
Em declarações à Agência Lusa, no dia 7 de Fevereiro de 2013, após ter sido ouvido pelo Tribunal de Coimbra como testemunha de defesa, Ferreira do Amaral afirmou estar “surpreendido” com as acusações sobre Horta e Costa, que “contradizem o comportamento que teve noutras situações como gestor”, nomeadamente na Semapa. “E uma pessoa acima de toda a suspeita”, assegurou.
Ferreira do Amaral também foi administrador não executivo da Inapa – Indústria Nacional de Papéis, entre 1996 e 2000, empresa que já fez parte do índice PSI 20 até ser substituída pelo Banif no dia 21 de Março de 2011. O actual presidente do Conselho de Administração da Inapa dá pelo nome de Álvaro Pinto Correia (ex-secretário de Estado da Habitação e Urbanismo, 1976-1977, e ex-secretário de Estado da Construção Civil, 1976), o qual integra em simultâneo as comissões de vencimentos do BES e da Portugal Telecom, no segundo caso com as funções de presidente.
No Conselho de Administração da Brisa, que deixou de integrar o índice PSI 20 no dia 10 de Agosto de 2012, depois de ter sido alvo de uma oferta pública de aquisição (bem sucedida) pelo Grupo José de Mello e pelo fundo britânico Arcus, encontram-se hoje mais dois ex-políticos: o vogal António Fernandes de Sousa (ex-secretário de Estado Adjunto e do Comércio Externo, 1991-1993, e ex-secretário de Estado Adjunto e das Finanças, 1993-1994), e a vogal Maria Corrêa de Aguiar (ex-secretária de Estado da Segurança Social, 2002-2004).
A concessionária rodoviária conta também com António Vitorino (ex-ministro da Defesa Nacional, 1995–1997, ex-juiz do Tribunal Constitucional, 1989–1994, entre muitos outros cargos) na presidência da respectiva Assembleia Geral. Na sequência de uma prolífica carreira Política – de ex-deputado a ex-secretário de Estado, ex-ministro, ex-eurodeputado, ex-comissário europeu, etc. -, Vitorino prossegue ao mesmo ritmo no meio empresarial. Além de presidir às assembleias gerais da Brisa e da Novabase, exerce idênticas funções na Finpro (do Grupo Amorim) e no Banco Santander Totta, ao que se acresce o cargo de administrador não executivo da Siemens Portugal.
Outro caso de acumulação de funções é o do ex-ministro Luís Mira Amaral que, além do cargo de vogal do Conselho de Administração da Novabase, é presidente executivo do Banco BIC Português (filial do banco angolano que comprou o BPN por 40 milhões de euros, no dia 30 de Março de 2012). O ex-ministro da Indústria e Energia (1987-1995), ex-ministro do Trabalho e Segurança Social (1985-1987) e ex-deputado (1995-1996), também foi administrador do BPI (1998-2002), da Cimpor (1997-2002) e da EDP (2002-2004), entre outras empresas. Mais, assumiu a vice-presidência da Caixa Geral de Depósitos (2002-2004), onde chegou a ser presidente executivo mas apenas durante seis meses (Abril de 2004 a Outubro de 2004).
A administração do banco do Estado é um dos maiores viveiros de ex-políticos e serve muitas vezes como trampolim para mais altos voos. Desde logo o presidente do Conselho de Administração, Fernando Faria de Oliveira, ex-deputado, ex-secretário de Estado da Exportação, ex-secretário de Estado das Finanças e do Tesouro e ex-ministro do Comércio e Turismo. Ou Rodolfo Lavrador, vogal do Conselho de Administração e da Comissão Executiva da Caixa Geral de Depósitos (CGD). Antes de ser nomeado como administrador da CGD, em 2008, Lavrador exerceu funções nos dois governos de António Guterres: chefe de gabinete do ministro das Finanças António Sousa Franco (1995-1999), chefe de gabinete do primeiro-ministro António Guterres (1999-2001) e secretário de Estado do Tesouro e Finanças (2001-2002).
Há mais ex-políticos no Conselho de Administração da CGD. Norberto Rosa, ex-secretário de Estado do Orçamento, é vogal do Conselho de Administração e vice-presidente da Comissão Executiva. Por sua vez, Nuno Fernandes Thomaz, ex-secretário de Estado dos Assuntos do Mar (2004-2005), também é vogal do Conselho de Administração. Aliás, Thomaz não se desligou da Política activa, ao manter-se como vogal do Conselho Nacional do CDS-PP.
Nos restantes órgãos sociais identificam-se mais ligações políticas. O presidente da Mesa da Assembleia Geral, Manuel Lopes Porto, foi deputado ao Parlamento Europeu entre 1989 e 1999. Quanto ao vice-presidente, Rui Machete, trata-se de um ex-ministro da Defesa Nacional (1985) e ex-vice-primeiro-ministro (1985), ex-secretário de Estado da Emigração (1975), ex-deputado à AR (1985-1994), entre outros cargos políticos, além de ter presidido ao Conselho Superior da SLN.
Quem também passou pela CGD foi Mário Lino, depois de ter sido ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (2005-2009). Em 2010, foi nomeado como presidente do Conselho Fiscal das seguradoras do Grupo CGD – Fidelidade Mundial e Império Bonança, cargo que abandonou em 2012. Tal como António Nogueira Leite, ex-secretário de Estado do Tesouro e das Finanças (1999-2000), que tem vindo a saltar de empresa em empresa nos últimos anos. Em 2011, renunciou ao cargo de vogal do Conselho de Administração da Brisa após ter sido nomeado vice-presidente executivo da CGD e presidente do Conselho de Administração do Caixa Banco de Investimentos.
Em Setembro de 2012, porém, Nogueira Leite entrou em rota de colisão com o Governo de Passos Coelho. Quando o primeiro-ministro anunciou a polémica medida de redução da Taxa Social Única, a qual não chegou a avançar, referindo-se ao putativo aumento das contribuições dos trabalhadores para a Segurança Social, Nogueira Leite desabafou na página pessoal que mantém na rede social Facebook: “Se em 2013 me obrigarem a trabalhar mais de 7 meses só para o Estado, palavra de honra que me piro, uma vez que imagino que, quando chegar a altura de me reformar, já nada haverá para distribuir, e preciso de me acautelar.”
Cerca de três meses depois, em Dezembro de 2012, Nogueira Leite demitiu-se dos cargos que ocupava no Grupo CGD. No entanto, não tardou a ser contratado por outra grande empresa, cotada no PSI 20. Em Fevereiro de 2013, tornou-se administrador da EDP Renováveis e membro da respectiva Comissão de Nomeações e Remunerações. Nogueira Leite que foi membro do Conselho Nacional do PSD (2008-2011) e passou pelos conselhos de administração de várias empresas, da CUF à José de Mello Saúde, EFACEC Capital, Reditus, Comitur, entre outras.
Em entrevista ao jornal Público (edição de 5 de Maio de 2013), Nogueira Leite revelou mais pormenores sobre a sua efémera passagem pela CGD. O ex-dirigente do PSD chegou a ser convidado – pelo primeiro-ministro Passos Coelho – para assumir a presidência executiva da CGD mas foi desconvidado na semana seguinte.
“- Pode esclarecer porque aceitou integrar a administração da CGD?
– Porque fui convidado para ser o presidente executivo e porque achei que provavelmente não teria nova oportunidade profissional tão boa.
– Quem o convidou?
– O primeiro-ministro.
– Quem o desconvidou?
– O primeiro-ministro.
– Passos Coelho levou quanto tempo a mudar de opinião?
– Uma semana. Reconheço que cometi um erro ao ter assumido funções de administrador da CGD naquelas circunstâncias, mas enquanto lá estive fui leal aos dois presidentes, assim como aos meus colegas. E claro que pelo ministro das Finanças só fui convidado para administrador executivo.
– E percebeu o que levou Passos Coelho a desconvidá-lo?
– Talvez se tenha precipitado quando me fez o convite para eu presidir à CGD e depois talvez tenha reflectido melhor. Falou com algumas pessoas e recuou.”
O trampolim da CGD catapultou vários ex-administradores, entre os quais se destaca Armando Vara, ex-secretário de Estado da Administração Interna (1995-1999) e ex-ministro da Juventude e do Desporto (1999-2000). Antes de se tornar administrador da CGD, em 2006, a única experiência que Vara tinha na actividade bancária consistia no facto de ter sido funcionário numa dependência da CGD em Vinhais, no concelho de Bragança, onde nasceu. Em Janeiro de 2008 transitou da CGD para a vice-presidência do Conselho de Administração do BCP, duplicando o salário, mas suspendeu as funções em Novembro de 2009, quando se viu envolvido no processo “Face Oculta“, relativo a alegados casos de Corrupção e outros crimes económicos no negócio da sucata.
Apesar de não ter exercido qualquer actividade no BCP entre Novembro de 2009 (data em que suspendeu as funções) e Julho de 2010 (quando apresentou a demissão do cargo de vice-presidente do Conselho de Administração), Vara recebeu 822 mil euros do BCP em 2010, um valor superior à remuneração do então presidente Carlos Santos Ferreira (647 mil euros em 2010), dos quais 562 mil euros de indemnização e 260 mil euros de remuneração fixa.
O mesmo Vara que está hoje a ser julgado no âmbito do processo “Face Oculta“, acusado de três crimes de tráfico de influências, em conjunto com outros 33 arguidos – entre os quais José Penedos (ex-secretário de Estado e ex-deputado à AR que assumiu a presidência da REN entre 2001 e 2009), acusado de dois crimes de corrupção e outros dois de participação económica em negócio.
Não obstante as acusações de que é alvo, Vara não cessou a actividade na esfera empresarial. Aliás, em Setembro de 2010, cerca de dois meses após ter saído do BCP, foi desde logo recrutado para a presidência do Conselho de Administração da Camargo Corrêa para África, cimenteira brasileira que dispunha então de 32,9% do capital da cimenteira portuguesa Cimpor (por sua vez, presidida naquela altura por António Castro Guerra, ex-secretário de Estado Adjunto, da Indústria e da Inovação, 2005-2009).
A Camargo Corrêa adquiriu a Cimpor em 2012, passando a controlar 94,8% do respectivo capital social. Ora, concluída a oferta pública de aquisição (OPA), a Cimpor acabou por sair do índice PSI 20 e está hoje a ser desmantelada pela Camargo Corrêa, por entre sucessivas notícias sobre o fecho de fábricas em Portugal e o despedimento de trabalhadores.
O actual presidente do Conselho de Administração da Cimpor é Daniel Proença de Carvalho, não por acaso o sócio presidente da sociedade de advogados (Uría Menéndez – Proença de Carvalho) que assessorou a Camargo Corrêa na OPA sobre a Cimpor. Além de presidir ao Conselho de Administração da Zon Multimédia, Proença de Carvalho, ex-ministro da Comunicação Social (1978-1979), acumula uma série de outros cargos: é presidente das assembleias gerais da Galp Energia, Socitrel, Edifer, Renova, entre outras; e é membro da Comissão de Vencimentos do BES.
Tal como a Cimpor, a REN também foi adquirida em 2012, mas permaneceu cotada no índice PSI 20. Na sequência da primeira fase de privatização da REN, a qual passou a ser controlada pelas empresas State Grid (25% do capital) e Oman Oil (15%), os respectivos accionistas reuniram-se em assembleia geral no dia 27 de Março de 2012 para escolher a nova administração para o triénio 2012–2014. Entre as saídas, destaque para Fernando Rocha Andrade, ex-subsecretário de Estado da Administração Interna (2005-2008), que foi administrador da REN entre 2008 e 2012.
Quanto às entradas, sobressai a nomeação de Emílio Rui Vilar, ex-ministro da Economia (1974-1975) e ex-ministro dos Transportes e Comunicações (1976-1978), para dois cargos: membro do Conselho de Administração e da Comissão de Auditoria da REN. Entretanto, 36 dias mais tarde, Vilar abandonou a presidência do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), funções que exerceu durante uma década (desde 2002). Substituído no cargo por Artur Santos Silva (presidente do Conselho de Administração do BPI e também ex-membro do Conselho de Administração da Jerónimo Martins), o presidente cessante da FCG foi cooptado, no entanto, como administrador não executivo da mesma instituição. Uma troca de cadeiras, na medida em que Artur Santos Silva era administrador não executivo da FCG (desde 2002).
No dia 19 de Outubro de 2012, ou seja, cerca de sete meses depois da nomeação para a REN, Vilar foi contratado pela sociedade de advogados PLMJ (um dos sócios fundadores da PLMJ dá pelo nome de José Miguel Júdice, ex-presidente da Comissão Política Distrital de Lisboa do PSD entre 1985 e 1986, partido do qual se desfiliou em 2006) como advogado consultor com enfoque nas áreas de “Energia, particularmente “Oil & Gas”, Direito Bancário e Financeiro, Fusões e Aquisições, Projectos, Arbitragem e Clientes Privados”.
Em relação ao sector da energia, importa salientar que, no âmbito da liderança executiva da FCG, Vilar presidiu também à Partex Oil and Gas (Holdings) Corporation, a companhia petrolífera da FCG, durante o mesmo período de tempo: 2002-2012. Aliás, no dia 3 de Maio de 2012 foi igualmente cooptado como administrador não executivo da Partex. Mais, exerceu as funções de presidente do Conselho de Administração da Galp Energia entre 2001 e 2002.
“Depois de muitos anos concentrado em tarefas de gestão, sobretudo no sector bancário e no mundo fundacional, este regresso ao Direito e à Advocacia é um novo e estimulante desafio. Espero que a minha experiência seja um contributo útil para a dinâmica de inovação e internacionalização da PLMJ, com cujos valores e rigor me identifico”, declara Vilar.
A nova etapa da carreira profissional de Vilar passa ainda pela acumulação das funções de presidente do Conselho Consultivo das Fundações (CCF), organismo criado na sequência da aprovação da Lei-Quadro das Fundações em Julho de 2012. O CCF funciona no âmbito da Presidência do Conselho de Ministros e tem as seguintes competências: emitir parecer sobre os actos administrativos relativos às fundações; pronunciar-se sobre os resultados de acções de fiscalização às fundações; emitir parecer sobre qualquer assunto relativo às fundações, a pedido da entidade competente para o reconhecimento; tomar posição, por sua iniciativa, sobre qualquer assunto relativo às fundações da competência da entidade competente para o reconhecimento.
De acordo com o Despacho n.° 13179/2012, publicado em Diário da República no dia 9 de Outubro de 2012, o primeiro-ministro Passos Coelho nomeou Emílio Rui Vilar como presidente do CCF, por um mandato de cinco anos, acompanhado por outros dois membros: Rui Machete e Luís Valente de Oliveira. Há um elemento curricular comum entre os três nomeados para o CCF: todos exerceram funções governativas.
Mais, todos têm ligações, directas ou indirectas, ao sector fundacional, cuja actividade é fiscalizada pelo CCF. Vilar exerce funções administrativas na FCG desde 2002. Machete foi presidente do Conselho Executivo da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento entre 1988 e 2010. E Valente de Oliveira é vogal do Conselho de Administração da Mota-Engil (ao mesmo tempo que preside à Assembleia Municipal do Porto, eleito nas listas do PSD) desde 2006. A mesma Mota-Engil que em 2011 criou a Fundação Manuel António da Mota, em homenagem à memória do fundador da empresa Mota & Companhia (e pai de António Mota, actual presidente do Conselho de Administração da Mota-Engil), com uma dotação inicial de um milhão de euros.
Vilar coincide no Conselho de Administração da REN com José Luís Arnaut (ex-ministro, ex-deputado, ex-secretário-geral do PSD, ex-vice-presidente da Comissão Política Nacional do PSD e actual presidente da Comissão Nacional de Auditoria Financeira do PSD), nomeado no dia 22 de Junho de 2012, na sequência da renúncia de Luís Palha da Silva (transitou para a vice-presidência do Conselho de Administração da Galp Energia e, em simultâneo, abandonou o Conselho de Administração da Jerónimo Martins, da qual foi presidente executivo entre 2004 e 2009).
Arnaut é sócio fundador da sociedade de advogados CMS Rui Pena & Arnaut, em cuja lista de clientes figura a mesma REN. O PS contestou a nomeação de Arnaut como administrador da REN pela voz do deputado José Junqueiro, que acusou o actual Executivo de fomentar “um dos maiores exercícios de promiscuidade entre a Política e os negócios”, em declarações à Agência Lusa.
“A privatização da REN, tal como a da EDP, funciona como uma espécie de espólio que o Governo distribui para Personalidades ou dirigentes topo de gama do PSD e do CDS. Depois de Eduardo Catroga ou de Celeste Cardona, vem agora José Luís Arnaut”, sublinhou Junqueiro. “Numa altura em que as pessoas já atingiram o limite dos sacrifícios, há uma casta no País que pertence ao Governo e que é formada por estas personalidades topo de gama para quem nada existe e para as quais tudo é permitido.”
Questionado pelo Jornal i, o mesmo Junqueiro concluiu: “Acaba sempre por ser da mesma maneira. As pessoas que participam na privatização acabam por integrar as direcções das empresas.” Por seu lado, Arnaut – o qual entrou na REN por sugestão da Riopele, empresa que detém 5% do capital da REN através da Oliren – assegura que foi nomeado devido à relação de confiança que mantém com o accionista privado e não através de uma eventual sugestão do Governo. “Fui eleito representante por um grupo de privados. Sou advogado da família Oliveira, que me sugeriu. Temos uma relação profissional e de amizade. Essas críticas são de um provincianismo barato”, lamentou Arnaut.
Não menos polémico foi o percurso de Joaquim Pina Moura, desde a militância no PCP até à presidência da Iberdrola Portugal. Pelo meio houve uma transferência entre partidos – do PCP para o PS -, seguindo-se o exercício dos cargos de secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro (1995-1997), ministro da Economia (1997-1999) e ministro das Finanças e da Economia (1999-2001), no âmbito dos dois governos liderados por António Guterres. Enquanto ministro da Economia, Pina Moura decidiu abrir as portas das estruturas accionistas da EDP e da Galp Energia às empresas concorrentes Iberdrola (espanhola) e ENI (italiana). Floje é presidente da Iberdrola Portugal, cargo que assumiu em 2004 e chegou a acumular, até 2007, com a actividade de deputado à AR (2001-2007).
Pina Moura exerceu também as funções de vogal do Conselho de Administração da Galp Energia, em representação da Iberdrola Portugal, desde 2004 até 2008 (ano em que a Iberdrola vendeu a participação que detinha no capital da Galp Energia). Mais, entre 2007 e 2009 foi ainda administrador da Media Capital, tendo anunciado a cessação da actividade Política e a renúncia ao mandato de deputado em 2007.
Ao assumir a liderança da Iberdrola Portugal, em 2004, Pina Moura convidou Fernando Pacheco a integrar a administração da empresa. Trata-se do ex-secretário de Estado da Indústria e Energia e ex-secretário de Estado Adjunto e do Orçamento que acompanhou sempre Pina Moura durante os tempos de ministro. Pacheco aceitou o convite e desde então é administrador executivo da Iberdrola Portugal.
Quem também cessou a actividade Política para se dedicar à administração de empresas foi José Ângelo Correia, ex-ministro da Administração Interna (1981-1983), ex-vice-presidente da Comissão Política Nacional do PSD (1981-1983) e, entre outros cargos, ex-deputado à AR (1976-1995). Angelo Correia preside hoje aos conselhos de administração de várias empresas, nomeadamente do Grupo Fomentinvest (no qual Passos Coelho exerceu os cargos de director financeiro, 2004-2006, e administrador executivo, 2007-2009) e da Lusitaniagás.
A Fomentinvest Ambiente, participada do grupo liderado por Angelo Correia, vendeu 20% do capital à Finertec em 2011. Antes de assumir as funções de ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares do actual Governo, Miguel Relvas foi gestor executivo da Finertec. De 2007 a 2009, Passos Coelho foi administrador executivo da Fomentinvest Ambiente. As ligações entre Relvas e Passos Coelho não se confinam à actividade Política (trata-se de uma longa relação de amizade e cumplicidade, desde os tempos em que militaram e assumiram cargos de direcção na JSD).
De 2000 a 2007, Passos Coelho foi consultor e administrador da Tecnoforma, uma empresa dedicada à formação profissional que “dominou por completo, na região Centro, um programa de formação profissional destinado a funcionários das autarquias que era tutelado por Miguel Relvas, então secretário de Estado da Administração Local”. Na sequência da publicação, entre Outubro e Dezembro de 2012, de uma série de artigos de investigação do jornal Público, o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) abriu dois inquéritos sobre as suspeitas de favorecimento da empresa Tecnoforma por parte de Relvas enquanto secretário de Estado com a tutela do programa Foral.
No âmbito de um dos inquéritos, Helena Roseta, actual vereadora da Câmara Municipal de Lisboa, foi ouvida em Janeiro de 2013 como testemunha. Na noite de 21 de Junho 2012, em directo na SIC Notícias, Roseta denunciou uma situação ocorrida com Miguel Relvas em meados de 2003. Numa altura em que exercia a presidência da Ordem dos Arquitectos (OA), Roseta terá sido abordada por Relvas com o intuito de a informar sobre verbas do programa Foral que poderiam ser canalizadas para cursos de formação promovidos pela OA, destinados a arquitectos de autarquias.
– Mas havia uma condição, e a condição era simplesmente esta: a formação tinha que ser feita pela empresa do doutor Passos Coelho. Eu fiquei passada, e disse: “Desculpe lá, senhor secretário de Estado, mas nessas condições não há acordo nenhum”. E não houve! – revelou Roseta, perante o olhar de estupefacção de Teresa Caeiro, que se apressou a ressalvar o eventual desconhecimento de Passos Coelho.
– Eu só queria acrescentar o seguinte, e com certeza que a Helena Roseta não o quis fazer. Não pode tirar a seguinte ilação: de que Pedro Passos Coelho, actual primeiro-ministro, sabia dessa exigência – sublinhou Caeiro.
– Não falei de Pedro Passos Coelho sequer, falei de Miguel Relvas só. Passou-se comigo! – anuiu Roseta.
“O outro inquérito relacionado com estes factos está a correr no Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra e incide especialmente sobre um dos projectos da empresa que mais dúvidas suscitaram acerca de eventuais favorecimentos de que ela tenha beneficiado. Trata-se de um projecto, no valor de 1,2 milhões de euros, que foi aprovado pelos gestores do Foral e se destinava a formar mais de mil funcionários de nove municípios da região Centro para trabalharem em nove aeródromos e heliportos daquela região, parte dos quais não existiam ou já estavam desactivados”, noticiou o jornal Público.
A mesma Finertec (em tempos gerida por Relvas) recrutou Marcos Perestrello, em Novembro de 2011, para as funções de administrador. Mas o actual deputado do PS e ex-secretário de Estado da Defesa Nacional acabou por se demitir da Finertec cerca de seis meses depois, quando surgiram notícias de que a empresa teria sido alvo de uma investigação, por suspeitas de fraude e evasão fiscal, no âmbito da “Operação Furacão”.
“O deputado socialista preferiu não fazer nenhum comentário, mas o proprietário da Finertec, Braz da Silva, garante que a saída se deveu a pressões. “É tudo muito recente e foi uma decisão motivada pela pressão que se está a criar sobre a empresa”, afirmou ao Jornal i, acrescentando que tudo o que se diz é infundado, até porque infelizmente a empresa nunca fez qualquer negócio com o Estado português”.
A Ongoing também tem recrutado ex-políticos: Agostinho Branquinho, Carlos Costa Pina e Guilherme Dray. “O que é a Ongoing? questionou o então deputado Branquinho, em Fevereiro de 2010, no âmbito de uma inquirição a António Costa (administrador da empresa) na Comissão Parlamentar de Ética. Cerca de oito meses depois abandonou a AR para se tornar administrador da Ongoing Brasil. Em Agosto de 2011 foi a vez de Costa Pina (ex-secretário de Estado do Tesouro e Finanças nos executivos liderados por José Sócrates) e Dray (ex-chefe de gabinete do ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Mário Lino, no primeiro Governo de Sócrates; e ex-chefe de gabinete do próprio primeiro-ministro, no segundo mandato) serem recrutados pela Ongoing. Costa Pina que transitou, entretanto, para o Conselho de Administração da Galp Energia.
Por sua vez, Dray permanece na Ongoing e acompanhou o ex-primeiro-ministro Sócrates, no dia 5 de Fevereiro de 2013, a uma reunião em Brasília com o ministro da Saúde brasileiro, Alexandre Padilha. Sócrates participou na reunião como presidente do Concelho Consultivo para a América Latina da empresa farmacêutica Octapharma (sediada na Suíça), para a qual começou a trabalhar a 1 de Janeiro de 2013. Quanto a Dray, “foi acompanhar o engenheiro José Sócrates a pedido deste e apenas como amigo”. A Octapharma é a empresa líder de vendas de derivados de plasma humano em Portugal, onde é a única fornecedora de plasma inactivado (componente do sangue dada directamente aos doentes), e tem até hoje 143 contratos com entidades públicas portuguesas registados no portal Base, perfazendo um valor total de 12.591.003,73 euros.
Em 2008, quando era secretário de Estado Adjunto e da Saúde do Governo de José Sócrates, Manuel Pizarro assinou um despacho que determinou o fim da aquisição centralizada de produtos de derivados do plasma humano, permitindo que as empresas do sector passassem a vender os produtos por ajuste directo aos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS). O actual deputado nega, contudo, qualquer envolvimento do ex-primeiro-ministro no processo. “Esta decisão foi integralmente tomada por mim, uma vez que era eu quem tinha a tutela do sangue, e nesta matéria não quero dividir responsabilidades com ninguém. O ex-primeiro-ministro não sabia que a medida estava a ser preparada”, assegurou Pizarro.