O Futuro da Internet

0
1140
Internet
Internet

Está actualmente em discussão o modelo de gestão (governance) da internet para os próximos anos, que poderá ter impacto no livre acesso à informação e ao conhecimento, bem como no próprio desenvolvimento da Internet. O que está em discussão é o enquadramento legal de regulação, de gestão e de desenvolvimento, quer ao nível das infraestruturas existentes (rede de servidores) quer dos mecanismos que garantem que a Internet é um espaço único e global (domínios, protocolos, etc.).

Actualmente, o organismo responsável pela governance da internet é a ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), entidade sem fins lucrativos com sede na Califórnia, ou seja, sujeita à legislação dos Estados Unidos da América (EUA) – este facto acontece por razões históricas, dado que a internet resulta do esforço de investigação e desenvolvimento (I&D) das políticas públicas dos EUA no século passado. Actualmente a internet é gerida pela ICANN, num modelo de concessão do governo dos EUA (contratos renováveis por quatro anos), que estipula que a gestão envolva vários actores e países a nível mundial, incluindo entidades públicas e privadas (modelo multistakeholder), num processo partilhado, democrático e colaborativo.

Nos últimos anos tem sido crescente a contestação de vários países e organizações a este modelo de funcionamento, por alegadamente os EUA poderem ter acesso privilegiado a dados dos utilizadores e a grande parte da infraestrutura da internet. Este receio foi recentemente manifestado pelo conselho da Europa, que alerta para a necessidade de medidas mais eficazes ao nível da protecção de dados e do respeito pelos direitos dos utilizadores da internet.

Por outro lado, aparecem vozes críticas (mais ao nível interno, nos EUA), ao afastamento dos EUA do papel de supervisão, dado que isso poderá colocar em causa o princípio de abertura e livre acesso à internet, como acontece actualmente em alguns regimes “menos democráticos” e autoritários, que têm limitado ou mesmo proibido o acesso à Internet ou a parte dos seus conteúdos. Se bem que esses países podem ter esse controlo a nível interno, já a nível global essa limitação e proibição não é possível – se por algum motivo a ICANN adoptasse uma política restritiva de acesso à internet (devido a eventual pressão por parte desses regimes), os EUA poderiam suspender ou adjudicar a outra entidade o contrato de gestão da internet, de forma a garantir a democraticidade e o livre acesso à informação e aos conteúdos.

De forma surpreendente (para alguns), e satisfazendo essas vozes mais críticas sobre o “controlo” da internet por parte dos EUA, a administração Obama anunciou já a intenção de não renovar o contrato com a ICANN para a gestão da internet, significando que, a partir de Setembro de 2015, a responsabilidade por essa gestão transitaria em exclusivo para a ICANN, deixando os EUA de ter o papel de supervisão de última instância que actualmente têm.

Contudo, é a própria ICANN que afirma que até Setembro de 2015 será impossível garantir que essa transição seja feita de forma adequada, dada a necessidade de garantir os recursos humanos, tecnológicos e financeiros necessários a uma boa gestão e manutenção de uma internet aberta a nível mundial. Ou seja, por questões de tempo e de falta de recursos, não é previsível que a vontade da administração Obama em sair da supervisão da internet seja possível tão cedo.

A juntar a isto, e dando corpo aos que veem na decisão da administração Obama uma ameaça ao livre funcionamento da internet e possível abertura a uma maior preponderância de regimes autoritários, o congresso dos EUA votou, por unanimidade, a manutenção dos EUA na supervisão, dado considerarem tratar-se de um tema sob tutela federal, o qual apenas o congresso poderá ter a decisão final – e não a administração Obama. Ou seja, um problema jurídico que não se prevê resolúvel até Setembro de 2015.

Em resumo, o futuro da regulação da internet é um aspecto fundamental para a continuação da existência de uma internet aberta, imune a pressões restritivas ou de exclusão, estando a Economia digital, a Economia em geral e a própria inclusão democrática dependentes das decisões que vierem a ser tomadas. Neste sentido, é importante tornar pública a posição da União Europeia sobre o tema, que se espera que seja uma posição única e bem fundamentada. Já agora, qual a posição de Portugal sobre o assunto?

António Bob Santos, Doutorando em Economia e especialista em Políticas de Inovação.

Artigo Original: tek.sapo.pt

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here