O Mau-Olhado

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Mau Olhado
Mau Olhado

Vamos encontrar a crença na transmissão de influências através dos olhos em praticamente todas as sociedades tradicionais. Na sua forma negativa, é o Mau-Olhado, o olhar de inveja que destrói tudo aquilo em que cai. “O homem que corre atrás da riqueza tem mau-olhado”, diz o Livro dos Provérbios do Antigo Testamento. Crianças, gado, colheitas, casas, carros, ou seja, tudo quanto possa ser alvo de inveja cai sob a alçada do mau-olhado. Ele é causa de doenças e infortúnio. Por isso é que se tomam tantas precauções contra ele, por exemplo, sob a forma de amuletos. Na Grécia actual, estes tomam normalmente a forma de um olho azul, o olho de Elorus, descendente directo de um dos talismãs do Antigo Egipto. Este olho ocupa um lugar de destaque no Grande Selo dos Estados Unidos, que figura em todas as notas de dólares.

O significado original da palavra “fascínio” tinha a ver com este poder de lançar um feitiço com o olhar, uso que subsiste em relação às serpentes que imobilizam a presa com o olhar. Na mitologia da antiga Grécia, o olhar da Medusa com serpentes por cabelos convertia os homens em pedras; a máscara da Medusa, na forma da cabeça das Górgonas, representava o poder aterrador da deusa Atena.

Eis algumas reflexões de Sir Francis Bacon sobre o tema do fascínio no seu ensaio «Sobre a Inveja», publicado em 1625:

“Que se saiba, não há afectos capazes de fascinar ou enfeitiçar para além do amor e da inveja; ambos têm desejos veementes, facilmente tomam a forma de imaginações e sugestões, e facilmente assomam aos olhos, em especial se na presença dos objectos que são os pontos que conduzem ao fascínio, se é que eles existem. Vemos também como as Escrituras chamam à inveja mau-olhado… Pelo que, ao que parece, se reconhece no acto da inveja uma ejaculação ou irradiação do olhar. Mais ainda, alguns, mais curiosos, repararam que as alturas em que o ataque ou percussão de um olhar invejoso causa mais dor é quando a parte invejada é vista em glória; porque isso aguça a inveja.”

A palavra “inveja”, por seu turno, vem do latim invidia, do verbo invidere, ver intensamente. Mas, embora a inveja seja a emoção que mais frequentemente se associa ao mau-olhado, pensa-se que outras emoções negativas, como a ira, também ferem as pessoas pelos olhos, como se depreende da conhecida frase “cravou-lhe uns olhos como punhais”. Mesmo na nossa Sociedade, considera-se que é indelicado olhar fixamente para as pessoas, acto susceptível de causar embaraço ou suscitar reacções agressivas.

Há pessoas cujo olhar é considerado mais pernicioso do que o de outras, e aquelas que têm “mau-olhado” são temidas como portadoras de infortúnio. Na Inglaterra medieval estavam generalizadas estas crenças, e as bruxas eram frequentemente acusadas de “lançar mau-olhado” sobre crianças ou animais domésticos que adoeciam sem razão aparente. Como diz o egiptólogo Sir Wallis Budge:

“Várias são as conclusões a que têm chegado àqueles que estudam o porquê e como do mau-olhado, mas em nenhuma parte do mundo se põe em dúvida que essa influência exista e a crença nela está para além de qualquer dúvida primeva e universal. Acresce que todas as línguas, antigas e modernas, contêm uma palavra ou expressão equivalente ao “mau-olhado”. O efeito positivo dos olhares, em especial dos olhares carinhosos, é outro alvo de reconhecimento generalizado. Na índia, por exemplo, há muita gente que visita os santos homens e mulheres por causa do seu darshan, que literalmente significa olhar, que se crê conceder grandes graças. Talvez uma reminiscência inconsciente do mesmo tipo de crença esteja presente no desejo popular de ver em pessoa a rainha de Inglaterra, o Presidente dos Estados Unidos, o Papa, as estrelas pop, ou outras celebridades. Embora seja mais cómodo vê-las na televisão, a sua presença física tem algo de imensamente apelativo, o que motiva as pessoas a passarem horas à espera, no meio de uma multidão, para as ver – e, melhor ainda, serem vistas por elas (“A rainha acenou-me!”). E caso para dizer que essas pessoas estão “debaixo do olho” de toda a gente.

Inveja
Inveja

Em resumo, a ideia de que as influências podem passar através dos olhos é praticamente universal. Ela pressupõe uma crença implícita na extensão da mente, capaz de influenciar o que se vê. Quando a Ciência convencional ignora ou nega esta possibilidade, não o faz com base numa análise cuidada das provas; raramente o assunto é sequer discutido. Fá-lo, antes, partindo do pressuposto convencional de que a mente está dentro do cérebro: é a teoria da mente contraída. A possibilidade de haver de facto algum efeito misterioso do olhar está pura e simplesmente fora de questão; é excluída por uma questão de princípio.

Claro que não se pode arrumar a questão com base nos preconceitos dos cientistas, nem pela crença popular, nem pela acumulação de indícios circunstanciais, nem pelas querelas teóricas sobre a natureza da mente. A única maneira de dar passos em frente é fazendo as experiências adequadas.

Fonte: LIVRO: «7 Experiências que podem mudar o Mundo» de Rupert Sheldrake

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