“Disseram de mim que me armava em Deus, e isso é uma barbaridade. Limitava-me a usar os dons que o Altíssimo me concedera para tentar defender algumas convicções que continuo a manter: creio que os Estados Unidos têm o direito a defender-se por todos os meios possíveis.” Assim falava Sidney Gottlieb, cientista-chefe da CIA, durante uma conversa com o famoso escritor Gordon Thomas. Mas quem era realmente este cientista a quem na CIA chamavam «Doutor Morte»?
Nascido em 1918 no seio de uma família de judeus húngaros, o doutor Gottlieb, cujo nome real era Joseph Schneider, foi o controverso consultor científico e chefe da Divisão de Serviços Técnicos da CIA, conhecida também como a «Casa dos Horrores». Em 1940 licencia-se com todas as honras em Ciências Químicas pela Universidade de Wisconsin. Em 1951 Schneider obteve o doutoramento em Química no Instituto Tecnológico da Califórnia. Nesse mesmo ano seria recrutado pela CIA, quando ainda se encontrava no campus universitário. Apesar de ter podido conseguir um posto mais bem remunerado na indústria química privada, sentia o apelo de um género de patriotismo e de uma ética que poderia manipular em interesse próprio e no dos Estados Unidos. A CIA seria o campo de testes para as suas experiências.
Allen W. Dulles, diretor da CIA entre 1953 e 1961, declararia anos depois que “Gottlieb nascera para a CIA e a CIA era para Gottlieb uma “companhia” à sua medida”.
Na CIA, o químico trabalhou dia e noite em diversas experiências enquanto ia subindo de grau na Divisão Técnica, até alcançar o posto de chefe da Divisão Química do TSS (Technical Services Staff, Corpo de Serviços Técnicos). Sem dúvida que ninguém poderia suspeitar daquele químico, que vivia com a esposa Margaret Moore e os quatro filhos numa quinta de doze hectares. Gottlieb ocupava-se a ordenhar as vacas e as cabras antes de sair todas as manhãs para o trabalho no laboratório secreto da CIA. Em mais do que uma ocasião chegou ao trabalho carregado de recipientes hermeticamente fechados com leite natural no interior. Gottlieb gostava de dar leite aos colegas de trabalho, ainda que estes jamais se atrevessem a prová-lo.
Pouco a pouco, o Doutor Morte foi ganhando nome dentro da comunidade dos serviços secretos, uma vez que Gottlieb era o cientista encarregado de desenhar e criar nas décadas de cinquenta e sessenta os venenos que seriam depois utilizados pela CIA para assassinar um espião inimigo ou um chefe de Estado ou de governo incómodo. Seria o responsável de fazer experiências com drogas para tentar dominar a mente de possíveis inimigos, durante as chamadas operações MKUltra e MKSearch. Não há dúvidas de que o químico foi o menino mimado de vários DCI (Director of Central Intelligence): de Allen Dulles a John McCone, de William Raborn a Richard Helms, mas essa sorte abandoná-lo-ia quando em 1973 as suas «invenções mortíferas» foram reveladas nas «Joias de Família». Por consequência, Sidney Gottlieb recebeu ordens para destruir todos os seus relatórios secretos para que não caíssem nas mãos dos investigadores do Congresso e do Senado. Sem dúvida que Gottlieb e os seus chefes na CIA sabiam que havia muita roupa suja a esconder.
Por exemplo, Gottlieb financiou, coordenou e superintendeu diversas experiências ‘de torturas realizadas sob apertada monitorização médica. Para tal reuniu um grupo de médicos, químicos e especialistas com ideias semelhantes às suas numa equipa “ultrassecreta” e compacta. Sidney Gottlieb pagava aos seus colaboradores com fundos especiais da CIA que apenas ele geria. Para o cientista, o seu trabalho na CIA era vital para a segurança nacional dos EUA, e ele próprio via-se como parte integrante de uma grande engrenagem que servia única e exclusivamente um só cliente: o presidente dos EUA e os seus interesses em qualquer ponto do planeta. Aos “seus” novos recrutas, Gottlieb mostrava primeiro a placa situada à entrada do edifício principal da CIA, onde se lia: «A verdade tornar-vos-á livres», e depois levava-os até à porta do seu gabinete, onde outra placa exibia o lema “O trabalho tornar-vos-á livres”, o mesmo que aparecia nas entradas dos grandes campos de extermínio do Terceiro Reich. Para o Doutor Morte, ambos os lemas eram um só.
Sidney Gottlieb era especialista em inventar substâncias químicas para provocar terror; em situações para desorientar um prisioneiro, como o isolamento contínuo em lugares pequenos e às escuras; ou simplesmente na utilização de eletrochoques para diminuir a resistência de um prisioneiro. Devem-se a ele todos estes sistemas de tortura. Também se deve a Gottlieb a utilização dos seus próprios colegas como cobaias.
A 19 de Novembro de 1953, Frank Olson, cientista da Divisão de Operações Especiais do Corpo Químico do Exército, sediado em Fort Detrick, no Maryland, bebeu um copo de licor quando confraternizava com vários colegas. O licor continha uma dose elevada de LSD.
Há várias semanas que Olson se mostrava contrário a muitas das experiências levadas a cabo no Projecto MKUltra e certificou-se de que o chefe, o doutor Sidney Gottlieb, o soubesse. Não restam dúvidas de que o chefe da operação temia que Frank Olson acabasse por falar com um jornalista ou um congressista. Se se descobrisse o que a CIA andava a fazer, decerto que o Projecto MKUltra chegaria ao fim. O Doutor Morte decidiu averiguar o potencial problema com Richard Helms, o director de Operações. Helms foi claro: “Se Olson fala, a CIA ver-se-á obrigada a acabar com o MKUltra.”
Gottlieb deu então ordens a George Hunter White, a sua mão executora, para que introduzisse o LSD na bebida de Olson. Meia hora depois de a ter ingerido, Olson começou a alucinar e a falar de coisas estranhas. Disse que conseguia ver os seus ossos e o modo como circulava a corrente sanguínea dentro do corpo. Disse também que todos os que trabalhavam com ele eram espiões e que não desejava falar com nenhum deles. Dez dias depois, Olson subiu ao terraço do Hotel Statler de Manhattan e lançou-se para o vazio. O alucinogénio fora introduzido na bebida de Olson por ordem do próprio doutor Sidney Gottlieb, chefe da Divisão Química do TSS e pertencente ao Diretório de Planos e Operações, com a autorização de Richard Helms, director de Operações, e de Willard Machie, o chefe de Gottlieb na CIA.
Olson era bioquímico e colaborador próximo de Gottlieb, que se especializara no fabrico de substâncias mortais, introduzidas em desodorizantes, cremes de barbear, pastas dentífricas ou repelentes de insectos. Olson era capaz de inocular a «peste negra» mediante um inocente bronzeador ou de criar um veneno capaz de matar centenas de pessoas e camuflá-lo numa simples carga de tinta de uma caneta de tinta permanente. A primeira experiência de Frank Olson para o MKUltra foi criar uma substância que, uma vez ingerida, alterava a identidade sexual do receptor. A substância foi testada, sem autorização legal, numa prisão do Kentucky e como resultado mais de metade da população dessa prisão sofreu de impotência durante vários anos. Outra invenção em que trabalhou foi uma substância com um odor parecido ao da diarreia, introduzida em tubos de pasta dentífrica e distribuída pelos países do bloco comunista. Quem lavava os dentes com a pasta de Olson jamais se via livre do sabor a excrementos na boca. Olson trabalhava nisto quando foi direccionado pela CIA para o projecto de «Controlo Mental».

Logo depois de Olson morrer, o próprio Allen Dulles telefonou ao comissário da Polícia de Nova Iorque, ordenando que não se elaborasse nenhum documento sobre a morte de Frank Olson. Para tal, Dulles disse ser “vital para a segurança nacional”. O chefe da Polícia não fez perguntas.
Durante o verão de 1949 Machie, o chefe de Gottlieb na CIA, efectuara uma visita para estudar e investigar os métodos de interrogatório utilizados pelos soviéticos. Na primavera de 1950 várias divisões da CIA começaram a considerar o emprego da hipnose para os interrogatórios. Em Abril de 1950 o DCI Roscoe Hillenkoetter aprovou o Projecto Bluebird, com o objectivo de “descobrir formas de condicionar a personalidade para alcançar a extracção não autorizada de informação mediante o Domínio Mental dos que não a desejam entregar”. Em Dezembro de 1950, e prestes a doutorar-se em Ciências Químicas, Sidney Gottlieb já trabalhava no emprego de drogas para induzir o transe hipnótico no Projecto Bluebird.
Entre 1951 e 1952 as responsabilidades das experiências de Gottlieb passaram do Departamento de Segurança e Inspeção da CIA para o OSI (Office of Scientific Intelligence, Departamento de Inteligência Científica). Então o Bluebird mudou de nome para Artichoke. A equipa dirigida pelo Doutor Morte obteve o primeiro êxito ao conseguir induzir a amnésia. Este triunfo pôs Sidney Gottlieb na mira dos seus chefes, quando estes lhe pediram que ele e a sua equipa se centrassem na procura de drogas da verdade ou de métodos hipnóticos para arrancar informação a um inimigo. Gottlieb e os seus começaram a investigar a aplicação de substâncias químicas e biológicas para operações secretas.
Finalmente, a 13 de Abril de 1953, Allen Dulles aceitou a recomendação de um influente funcionário do DDP (Deputy Director for Plans, Subdiretório de Planos) da CIA chamado Richard Helms para estabelecer um programa com supervisão de Gottlieb, a fim de “investigar o desenvolvimento e a capacidade do uso de materiais químicos e biológicos”. Helms escreveria então: “Permitir-nos-á conhecer o potencial do inimigo mediante o uso de técnicas que só nós [a CIA] conheceremos.” O orçamento inicial foi de 300.000 dólares. O primeiro material documental utilizado seria o compilado desde 1953 no chamado Projecto MKUltra. O novo subprojecto chamar-se-ia MKDelta.
O Diretório de Ciência e Tecnologia continuou a investigar o efeito de centenas de drogas, incluindo a cocaína, a nicotina e a mescalina, mas o LSD foi o que despertou maior interesse entre os cientistas da CIA devido ao seu efeito ingovernável. A CIA precisava de saber se existia alguma droga que conseguisse distorcer a lealdade de um agente inimigo alterando o sentido da realidade. Gottlieb prometeu a Helms que conseguiria induzir a traição com uma dose prolongada de LSD injectada no suposto espião inimigo.
Em Novembro de 1953 decidiu testar a nova droga sintética num grupo de cientistas do Corpo Químico do Exército. A administração da droga ao grupo de cientistas realizou-se sem a autorização nem do Departamento de Defesa, nem dos próprios interessados. Gottlieb, ao que parece, recebeu apenas uma “aprovação” não escrita para levar a cabo o seu plano. A SOD (Special Operations Division, Divisão de Operações Especiais) e os seus cientistas trabalhavam a tempo inteiro para a CIA, concebendo dardos besuntados com agentes biológicos, pílulas venenosas ou balas envenenadas com substâncias como a gangrena ou a peste. A morte de Frank Olson, vítima das alucinações provocadas pela ingestão de uma forte dose de LSD, não deteve nem as experiências nem a carreira do doutor Sidney Gottlieb na CIA. Muito pelo contrário.
Homem pouco atraente, de pequena estatura, asseado e com o cabelo perfeitamente cortado, quase rente, Gottlieb parecia mais um professor universitário despistado que um “cientista maluco” implacável da CIA. Pare ele, o êxito não se baseava em medalhas, mais dinheiro ou palmadinhas nas costas do DCI da altura. Para Gottlieb o verdadeiro êxito baseava-se em dominar a mente e a vontade dos seres humanos, e para tal precisava de “cobaias humanas”, fosse onde fosse que as pudesse encontrar. Para o Doutor Morte o trabalho na CIA era o que o presidente Eisenhower definia como «conceito do desmentido convincente» ou, o que vai dar ao mesmo, “na CIA fazem-se coisas que é melhor não tentar explicar”.
Daí em diante, Gottlieb percorreu pessoalmente todas as selvas do mundo à procura de substâncias naturais com que matar mais depressa. Deixou bem claro o seu ponto de vista sobre a liquidação de inimigos quando declarou: “Em geral matar não é correto, mas é permissível quando está em jogo a segurança nacional dos Estados Unidos. A decisão de matar não deve ser tomada de ânimo leve, mas, uma vez tomada, deve ser levada avante. Deixa de ser o momento de reflectir sobre questões morais.” Allen Dulles tinha uma política parecida e centrada no papel que a CIA deveria desempenhar na nova ordem criada após a Segunda Guerra Mundial. “A CIA devia tornar o Novo Mundo um mundo melhor, para o que podia ser aceitável que um homem cometesse actos ilícitos”, diria o próprio Dulles.
No fim de 1952 Sidney Gottlieb e mais seis cientistas dedicaram-se a percorrer diversas cidades da Europa ocidental à procura de “cobaias humanas”. O perfil destas cobaias ia desde informadores absolutamente leais aos Estados Unidos até agentes duplos e inclusive ex-membros do Waffen-SS. Para Gottlieb e para a CIA, afinal de contas, todos eles eram qualificados como “dispensáveis”. Em casas-esconderijo montaram laboratórios, celas clandestinas e mesmo pequenas salas de operações. No inicio de 1953 todas as experiências fracassaram e os “pacientes involuntários” faleceram, chegando muitos deles a suicidar-se ao enlouquecerem com o efeito das drogas administradas pelos cientistas da CIA.
Em Fevereiro de 1953 ocorreu uma reunião secreta na Sala Oval da Casa Branca. Estavam presentes apenas Allen Dulles, director da CIA, e Dwight D. Eisenhower, presidente dos Estados Unidos. Dulles disse ao presidente que Sidney Gottlieb não conseguira absolutamente nada com as suas experiências na Europa e que seria necessário continuar com as investigações. Isto supunha processos clínicos supervisionados, um hospital para poder levá-los a cabo e um orçamento sem fiscalização de nenhum órgão executivo ou legislativo. Ninguém deveria fazer perguntas. Pela cabeça tanto de Dulles como de Eisenhower passava a pergunta que Gottlieb fez ao DCI: «Os “pacientes” que se utilizarão para as experiências serão norte-americanos?»
A Casa Branca pretendia ter uma palavra a dizer sobre as experiências que iam ser levadas a cabo. Para isso o presidente deu plenos poderes a Dulles para decidir quem formaria a dita comissão. A primeira pessoa seria Richard Helms, um dos principais protectores de Sidney Gottlieb; a segunda era o doutor James Monroe, especialista na administração de drogas a doentes mentais; a terceira, o prestigiado neurologista Harold Wolff, professor na Universidade de Cornell; a quarta, o misterioso doutor Ewen Cameron, membro do conselho de administração da Universidade McGill, especialista em Controlo Mental e ainda mais especialista na angariação de fundos; a quinta era o doutor William Sargant, psiquiatra inglês, que dava apoio em matéria de interrogatórios aos serviços secretos britânicos e escrevera «Battle for the Mind». Assim nasceria o Projecto MKUltra. As letras «MK» indicavam que era um projecto da Divisão Técnica. A palavra «ULTRA» queria dizer que tudo o que seria levado a cabo no âmbito do novo projecto devia ser absolutamente secreto.
A CIA ocupar-se-ia de gerir tudo o que dissesse respeito a financiamento, Tecnologia e ciências aplicadas. O Projecto MKUltra incluiria também a “acção executiva”, forma de na CIA se designar os assassínios “autorizados”.
Allen Dulles e Sidney Gottlieb decidiram dar ao MKUltra um certo ar científico, criando uma fundação chamada Society for the Investigation of Human Ecology Foundation, com sede na Rua 78 em Nova Iorque. O doutor Monroe presidiria a fundação. Os primeiros processos que iam ser estudados um a um seriam os 7190 que se referiam aos prisioneiros norte-americanos na Coreia e que tinham sofrido de um modo ou outro lavagens ao cérebro, Controlo Mental e testes de drogas por parte de cientistas chineses, checos, soviéticos e norte-coreanos.
Entretanto, no quartel-general da CIA em Langley, o Doutor Morte iniciara o primeiro de vários subprogramas do MKUltra para administrar drogas e substâncias tóxicas a pessoas absolutamente sãs e normais que não tinham sido prevenidas. Estes subprogramas receberiam os nomes Bluebird e Artichoke; um pouco mais tarde chegaria também o subprograma Naomi, que consistia na inoculação de drogas em pessoas classificadas como “dispensáveis”.
Gottlieb também utilizou animais para serem programados como “escutas vivas”. Num relatório do fim de 1954, o próprio Gottlieb explica a Allen Dulles por que motivo perderam 15.000 dólares do orçamento do MKUltra: “Um dos problemas apresentados pela introdução de um aparelho de áudio na parede ou debaixo do colchão é que, tal como as câmaras, captam o que vêem e não o que um humano captaria. Nós, seres humanos, temos no ouvido a cóclea, que oculta alguns sons e nos permite ter uma conversa numa festa. Temos andado a usar uma cóclea verdadeira procedente de um gato. Pusemos-lhe um cabo para que tudo ficasse ocultado. […] Abrimos o gato, pusemos-lhe pilhas e um cabo. Utilizamos o rabo como antena. […] Reparámos que quando tinha fome saía do lugar de escuta, pelo que lhe pusemos outro cabo para evitar que tivesse fome. Um dia enviámo-lo para captar uma conversa e quando se preparava para atravessar a rua, foi atropelado por um camião. A experiência terminou deste modo», concluiu Gottlieb. Todos os testes com o gato e os artefactos que lhe tinham inserido custaram cerca de 15.000 dólares.
Outra das experiências mais famosas desenvolvidas por Gottlieb e o doutor Ewen Cameron foi o que anos depois viria a ser conhecido como «o candidato da Manchúria». Pela repetição constante de uma palavra ou frase-chave que actuam como impulso, poder-se-ia estabelecer uma tendência persistente para actuar de um modo predeterminado. Por outras palavras, por meio de um impulso verbal era possível, sem excepção, inculcar no paciente uma duradoura tendência favorável a esse estimulo. Foi nisto que Sidney Gottlieb mais trabalhou. O seu sonho era conseguir que um homem normal recebesse uma chamada e, após ouvir pronunciar a “palavra-chave de impulso”, pudesse até assassinar o dirigente-máximo da União Soviética. Um sonho, sem dúvida.
Para os testes, o doutor Gottlieb usou uma prostituta que fora sequestrada por agentes da CIA destacados para o programa MKUltra. A mulher foi atada a uma mesa e puseram-lhe nos ouvidos uma espécie de auscultadores ligados a um magnetofone. A gravação repetia uma e outra vez que a mulher não tinha superado a rejeição materna.
Gottlieb usou sete vezes a gravação. A mulher apenas perguntou se devia escutar e repetir o que ouvia. A gravação passou outras onze vezes. A mulher gritou que não aguentava mais. Gottlieb voltou a passar a gravação mais sete vezes. A mulher reconheceu que era verdade, que não conseguira superar a rejeição da mãe. O Doutor Morte passou a gravação mais dezanove vezes. A mulher começou a tremer, a suar abundantemente e a soluçar, enquanto gritava que odiava o som e a voz. O cientista da CIA voltou a ligar o magnetofone em trinta ocasiões, ao que a mulher reagiu lançando gemidos e afirmando que odiava a mãe. À trigésima quinta vez, a mulher teve convulsões, entre prantos, gritando que desejava matar a mãe e matar-se a si própria. O mais curioso é que a prostituta jamais conhecera a mãe, uma vez que esta a abandonou assim que a filha nasceu.
Graças a este êxito, os doutores Gottlieb e Cameron tornaram-se inseparáveis. Podiam fazer experiências com seres humanos sem se preocuparem com qualquer questão ética. Eram como deuses que decidiam a vida ou a morte dos seus pacientes, quase com o mesmo poder com que anos antes os responsáveis e os médicos do SS decidiam a vida ou a morte de milhões de pessoas nos campos de extermínio da Europa.
Em mais do que uma ocasião, o doutor Osmond Solandt, assessor do CSIS (Canadian Security Intelligence Service, Serviços Secretos Canadianos), e amigo de Ewen Cameron, advertira Cameron sobre os perigos de trabalhar para uma organização como a CIA, mas Cameron achava-se intocável como o seu homólogo, Sidney Gottlieb. Ao fim e ao cabo, Cameron era já presidente da Associação Psiquiátrica da América e estava prestes a ser nomeado também presidente da Associação Psiquiátrica do Canadá. Gottlieb dedicava-se somente a contratar cientistas com o único objectivo de descobrir como os comunistas dominavam mentalmente os seus prisioneiros.
No ponto culminante do Projecto MKUltra, pelo menos vinte e três instituições norte-americanas financiadas pela CIA conduziam programas de investigação para o «Controlo Mental». O Allan Memorial Institute, criado e financiado pela CIA, era o quartel-general do MKUltra. Outras instituições eram a Psychopatic Institution de Boston, a Faculdade de Medicina da Universidade do Illinois, o Mount Sinai, a Universidade de Columbia, a Universidade de Chicago ou a Universidade de Rochester, entre outras.
Situado na fronteira entre o Canadá e os EUA, o edifício encontrava-se em território canadiano. Assim, caso alguém descobrisse o que se estava a fazer, a Casa Branca de Eisenhower poderia sempre declarar que as experiências se realizavam sem o conhecimento do governo dos EUA por se tratar de território canadiano.
O funcionário da CIA William Buckley, destacado para o Allan Memorial Institute no âmbito do Projecto MKUltra por ordem expressa de Allen Dulles, escreveu num primeiro relatório ao DCI em Langley: “Cada experiência está prevista para atingir um objectivo. As primeiras pretendem reduzir o indivíduo a um estado total de remorso, vergonha e temor. A sua mente enche-se de imagens aterradoras, cujo poder aumenta porque o indivíduo está debilitado por falta de comida, água e de dormir. Fica reduzido a um estado de total desconsolo. De repente, o primeiro de uma série de exercícios, animam-no. […] É provavelmente o método mais poderoso jamais concebido para conseguir dominar a mente de um homem, e isto consegue-se pelo emprego prévio de terror e vergonha mentais de forma continuada, durante dias, semanas e meses.”
Outro dos homens fulcrais do MKUltra seria George Hunter White. Trabalhara no OSS durante a Segunda Guerra Mundial sob o comando directo de Dulles. White era realmente o que na CIA se chamava «liquidador». Em 1943 foi enviado à Índia para liquidar um espião chinês que trabalhava para os japoneses. White matou o chinês numa rua apinhada de testemunhas, dando-lhe um forte murro na cara. Algumas partes do crânio incrustaram-se no cérebro do espião.
George Hunter White passou depois a fazer parte da Agência Federal de Narcóticos. Como agente de campo, White viajou por toda a Europa e América do Sul seguindo o rasto dos grandes tráficos.
O método do agente era simplesmente sequestrar os traficantes ou os familiares dos traficantes. Injetava-lhes cuidadosas doses de heroína ou cocaína e, se não falassem, dava-lhes um murro na cara, matando-os. Homens, mulheres, idosos e até uma ou outra criança morreram por acção do punho de White.
O agente continuava em contacto com membros do OSS, agora na CIA. Um dia, George White disse ao seu antigo chefe que desejava encontrar um trabalho à sua medida, e sem dúvida que a CIA era para um tipo como ele.
Sidney Gottlieb tinha uma importante tarefa para desenvolver no âmbito do MKUltra e George Hunter White era a pessoa ideal para isso. O Doutor Morte encomendou a White a tarefa de conseguir casas-esconderijo em todos os estados dos EUA a fim de levar para lá pessoas a quem se administrariam drogas. Pouco depois, Gottlieb deu ordens a White para se ocupar também de conseguir pacientes “voluntários” para levar a cabo as experiências. Numa carrinha preta, White dedicou-se a “recrutar” prostitutas. Num primeiro momento, White ensinou-as a administrar LSD aos clientes, para depois torná-las elas mesmas em “cobaias humanas”. George White utilizava as casas-esconderijo como bordéis, enquanto se dedicava a testar todas as substâncias que passavam pelos registos do MKUltra. Um dia, Sidney Gottlieb chegou a uma casa-esconderijo para se reunir com White e deu com este sentado numa cadeira a disparar balas de cera à sua imagem reflectida num espelho.
Pouco depois, o Diretório de Operações da CIA tentou despedir White, mas Gottlieb pensou que deviam perdoá-lo considerando os serviços prestados e encaminhá-lo para uma tarefa menos exigente. George Hunter White seria nomeado director da Amazon Natural Drug Company. Esta companhia era a menos conhecida do grupo de empresas criadas pela CIA, como apoio às suas operações secretas. Isto devia-se em parte a que a Amazon Natural Drug Company não era directamente gerida de Langley, mas do Allan Memorial Institute e, por conseguinte, por Sidney Gottlieb.
Localizada em Iquitos (Peru), em plena selva da Amazónia, a Amazon Natural Drug Company operava como uma companhia que colhia plantas tóxicas ou alucinogénicas com o fim de encontrar antídotos para os laboratórios farmacêuticos de todo o mundo. Este era o rosto público da empresa. O rosto oculto era bem diferente. Sob o comando de George Hunter White e posteriormente de Joseph Caldwell King, a companhia dedicou-se a contratar os melhores especialistas em botânica e Antropologia e especialistas em tribos da Amazónia para colher raízes, cogumelos ou extratos vegetais e obter deles os componentes tóxicos e alucinogénicos, e depois enviá-los para o Allan Memorial Institute, onde eram testados em seres humanos. Tanto White como King supervisionaram durante anos os “caçadores de substâncias” da CIA. As substâncias colhidas pela Amazon Natural Drug Company eram enviadas para os laboratórios da CIA, sob a supervisão de Morse Allan, um dos químicos do TSS, para posterior distribuição pelos diferentes organismos que se encontravam à sombra do MKUltra.
Outro dos programas desenvolvidos pelo MKUltra seria o chamado «Projecto 68». Este pretendia reproduzir o mais fielmente possível as condições de reclusão dos prisioneiros norte-americanos nas prisões norte-coreanas. Nas caves do Allan Memorial Institute instalou-se um centro de interrogatórios sem aquecimento para simular as baixas temperaturas da Coreia do Norte. À frente do Projecto 68 estava o doutor Ewen Cameron, o especialista em Controlo Mental.
Na cave instalaram-se duas salas de interrogatório: a “sala quadriculada” e a “sala de isolamento”. A primeira tinha umas linhas brancas pintadas na parede e diante dela uma cadeira que obrigava o prisioneiro a permanecer constantemente de costas direitas. A segunda sala estava isolada por uma porta pesada e forrada com colchões grossos. Ewen Cameron utilizava esta segunda sala para demonstrar que muitas instabilidades mentais eram provocadas pela falta de coordenação entre o paciente e o ambiente que o rodeava. Por exemplo, os pacientes — ou melhor, cobaias — do Projecto 68 eram impedidos de dormir ou de ir à casa de banho, também eram impedidos de saber se era de dia ou de noite ou a que horas tinham entrado na “sala de isolamento” e a que horas eram de lá retirados. Os interrogadores até costumavam mudar a hora do relógio que havia na sala para desorientar os “pacientes-prisioneiros”.
Cada paciente era escolhido pelo próprio Cameron, depois de descobrir algum dado que o prisioneiro quisesse esconder. Cameron supervisionava pessoalmente os interrogatórios até o “paciente-prisioneiro” revelar a informação que ocultava. O cientista anotava absolutamente tudo. Desde as perguntas feitas ao prisioneiro às respostas deste, o tempo decorrido até que o prisioneiro revelasse a informação, as suas reações, etc. As «Jóias de Família» demonstrariam anos depois que foram aplicados aos pacientes do Projecto 68 drogas e electrochoques para destruir zonas cerebrais e que os homens de Cameron pensavam que tinham poder sobre os pensamentos, os impulsos e até os desejos. Alguns dos pacientes foram jovens como Rosemary Bonner, de vinte anos. Cameron diagnosticou-lhe insónia crónica e depressão. Administraram-se-lhe altas doses de insulina e LSD. Também se lhe aplicaram electrochoques até a deixar sem sentidos.
Outro caso foi o de Penelope Hastking, de dezanove anos. Penelope tencionava ingressar num convento para seguir a via religiosa. Uma noite, na quinta onde vivia, um amigo beijou-a na boca e ela sentiu excitação sexual. A jovem apresentava sintomas de tonturas, náuseas e uma forte dor nos seios. Estava a segregar leite. O seu médico disse ser impossível que estivesse grávida, pois ainda era virgem. Foi por fim encaminhada para Ewen Cameron, que lhe diagnosticou esquizofrenia. Penelope Hastking foi submetida a electrochoques e administraram-se-lhe várias doses de LSD e até pequenas doses de curare, recolhido pelos “caçadores de substâncias” da Amazon Natural Drug Company.
A 27 de Setembro de 1961, Allen Dulles abandonou a CIA após o fiasco da Baía dos Porcos. O presidente John F. Kennedy nomeou John McCone como novo director. O próprio McCone comunicaria pessoalmente a Sidney Gottlieb que o MKUltra continuaria em actividade.
A operação MKUltra abarcou cerca de 142 subprogramas, 33 dos quais não conseguiram resultado algum. Outros subprogramas, geridos também por Sidney Gottlieb, incluíam a estimulação cerebral eléctrica, a implantação de eléctrodos nos cérebros de animais ou a experiência de dirigir animais, sobretudo cães e gatos, mediante controlo remoto. As experiências no âmbito da operação MKUltra continuaram até 1963, quando o inspector-geral da CIA descobriu o programa durante uma inspecção das operações do DS&T (Directorate of Science and Technology, Diretório de Ciência e Tecnologia).
Alguns investigadores garantem que o fim do MKUltra foi a 15 de Junho de 1963, embora se saiba por documentos da própria CIA que Sidney Gottlieb e vários dos seus ajudantes participaram desde Outubro de 1968 em operações de assassínio levadas a cabo no Vietname do Sul, no âmbito do programa Phoenix, dirigido por William Colby e William Buckley.
Os cientistas do MKUltra conseguiram no Sudeste Asiático um verdadeiro laboratório para as suas experiências e um sem-fim de “cobaias humanas” para essas mesmas experiências. Tanto Gottlieb como Colby ou Buckley sabiam que ninguém, nenhum jornalista incómodo ou comissões de investigação, faria alguma vez perguntas sobre vietcongues desaparecidos na prisão clandestina de Bien Hoa.
Aí, Sidney Gottlieb aplicou sobre os prisioneiros de guerra técnicas como a lobotomia, a administração de drogas como LSD, heroína ou cocaína, electrochoques directamente sobre as zonas cerebrais, etc. O propósito era conseguir que, mediante uma ordem, os prisioneiros se atacassem uns aos outros. Quase sessenta prisioneiros foram tratados com eléctrodos directamente no cérebro por Sidney Gottlieb, mas com o passar dos dias os “pacientes” dedicaram-se a sentar-se placidamente sem emitir qualquer som. “Gottlieb deu ordens aos vigilantes para os levarem a todos. Depois deram-lhes um tiro e queimaram os cadáveres”, recordaria o próprio Buckley anos depois.
William Buckley decidiu informar directamente do sucedido o seu chefe imediato e responsável máximo do Phoenix, William Colby. O futuro DCI disse-lhe apenas: “Esquece tudo o que viste.”
Mas o Doutor Morte não ficou por aí. Depois de regressar aos Estados Unidos e analisar a sua experiência com os prisioneiros do Vietcongue capturados e lobotomizados, Gottlieb poria em marcha um novo programa dentro do MKUltra chamado Climax. Gottlieb estava entusiasmado com este novo programa e fê-lo saber a Richard Helms. O próprio Helms daria luz verde ao projecto.
Durante a estada em Saigão, Sidney Gottlieb fixou-se no modo como as prostitutas vietnamitas eram capazes de se insinuar diante dos soldados norte-americanos e “quase dominá-los”. Muitas destas mulheres eram usadas pelo Vietcongue para matar militares. Com o programa Climax, Gottlieb desejava saber até que ponto um homem poderia cometer um delito em troca de sexo. Para pôr à prova o Clímax escolheu-se a cidade de São Francisco. Destinou-se, por ordem expressa de Helms, cerca de 250 mil dólares para o programa.
Alugaram-se dois pisos para servir de casa-esconderijo no bairro da Nob Hill e recrutaram-se as prostitutas mais jovens, que disfarçaram de adolescentes, com uniformes universitários. Criaram-se-lhes fichas com todo o tipo de informação. Desde a sua idade até aos motivos para exercerem a prostituição, e inclusive o que estavam dispostas a fazer e a não fazer, no que a sexo se referia. Uma delas relatou que um famoso empresário da Califórnia a contratara para ter relações sexuais com os seus dois mastins, que adorava. Outra explicou com todas as letras como um político a contratara para ir para a cama com a sua filha de catorze anos e o seu filho de dezassete, ter relações sexuais com um de cada vez e incitar o rapaz a ter relações sexuais com a própria irmã, enquanto o pai filmava a cena. Sidney Gottlieb e Richard Helms desfrutavam destas histórias.

A primeira missão encomendada às espias-prostitutas foi organizar uma grande festa. Com pulverizadores agentes do MKUltra espalhariam LSD sobre metade das pessoas para conseguir “animá-los” a todos. O problema surgiu quando o dia escolhido para a festa se revelou demasiado quente e húmido. Assim que a festa começou, os agentes da CIA começaram a dispersar o LSD, mas como o ambiente era tão sufocante, os convidados decidiram abrir as janelas. Ainda que os homens de Gottlieb tentassem fechar as janelas, os convidados voltavam a abri-las, deixando que o LSD fosse levado pelo ar. O projecto Clímax foi encerrado uma semana depois. Helms não parava de rir quando lhe contaram o que aconteceu na festa.
A 4 de Julho de 1963 apareceu o primeiro de vários estudos em revistas médicas sobre os efeitos negativos do LSD. O artigo mostrava como pessoas que tinham ingerido LSD acreditavam ser Jesus Cristo, poder voar ou transformar-se num pássaro. “Muitas delas”, afirmava o autor, “chegaram a atirar-se das janelas ou dos terraços dos edifícios onde viviam, trabalhavam ou estudavam”.
Durante os meses finais de 1963 e os primeiros meses de 1964 as instituições do MKUltra deixaram de receber os fundos necessários para continuar as investigações. A 26 de Julho de 1964 Ewen Cameron apresentou a demissão irrevogável, empacotou todos os arquivos com a indicação “altamente secreto”, abandonou o Allan Memorial Institute e refugiou-se na sua casa de Lake Placid. No dia seguinte, 27 de Julho de 1964, William Buckley apareceria com dois funcionários do Departamento de Segurança da CIA na casa do psiquiatra e exigir-lhe-ia a entrega de todos os relatórios, documentos e notas que Ewen Cameron tinha em seu poder sobre o MKUltra. A 4 de Agosto do mesmo ano, Buckley enviou uma nota informativa a Sidney Gottlieb e a Richard Helms em Langley, onde garantia que Ewen Cameron jamais revelaria alguma coisa do MKUltra. O projecto acabava de morrer.
Em Junho de 1975, Alice Olson, viúva de Frank Olson, soube o que acontecera realmente ao marido. O Congresso autorizou a entrega de 750.000 dólares em jeito de indemnização.
Na verdade, a primeira revelação sobre a existência do Projecto MKUltra sucedeu durante a investigação da chamada Comissão Rockefeller criada pelo presidente Ford e presidida pelo seu vice-presidente, Nelson Rockefeller, para investigar os abusos da CIA. O DCI Richard Helms ordenou a destruição total de documentos relativos ao MKUltra; o DCI James Schlesinger pô-los a descoberto e o DCI William Colby revelou-os ao Congresso. Quando a Comissão Church pôde ler os documentos relativos ao projecto, o próprio Frank Church declararia: “Desde o início de 1953 até finais de 1963, o programa de administração de LSD a seres humanos não voluntários demonstrou uma falha na chefia da CIA ao não prestar atenção adequada aos direitos dos indivíduos e orientação eficaz aos empregados da CIA. Sabemos agora que os testes realizados eram perigosos, pôs-se em risco a vida dos indivíduos e ignoraram-se os seus direitos.”
A publicação seguinte de documentos sobre o MKUltra e o MK-Search aconteceria em 1979, quando o escritor John Marks escreveu «The Search for the Manchurian Candidate». Marks escreveu o livro baseando-se em quase 16.000 páginas de documentos descobertos em 1977 por membros da administração de Carter. Por ordem do presidente Carter os funcionários estavam a examinar velhos documentos sobre “orçamentos secretos” manejados pela CIA. Os investigadores encontraram os documentos relacionados com o projeto MKUltra e as instituições, empresas e fundações criadas em segredo por Sidney Gottlieb para levar a cabo as suas experiências.
A melhor definição do que implicou o Projecto MKUltra foi dada pelo mesmíssimo William Buckley quando disse: “O MKUltra convertera-se num jogo sinistro onde jogavam alguns homens como Gottlieb e Cameron porque queriam acreditar no projecto. Na verdade, não acreditavam, mas desejavam fazê-lo.”
Ewen Cameron faleceria a 9 de Setembro de 1968, vítima de um enfarte. O British Medical Journal escreveu depois da sua morte: “Cameron possuía grandes qualidades organizativas, mas continuou a exercer medicina até ao fim. Preferia tratar pessoalmente alguns pacientes a permanecer num cargo que tantas responsabilidades administrativas e docentes implicava. Graças a isso estava sempre atento aos problemas individuais dos pacientes e era também capaz de debater tratamentos com base numa experiência pessoal. Se bem que lhe custasse aturar idiotas, apoiava com todas as suas forças quem, na sua opinião, fazia o possível para melhorar o tratamento dos doentes mentais. […] Cameron morreu tal como teria desejado, sempre na luta, planeando novos programas de investigação. Ewen Cameron, com o seu trabalho e o seu exemplo, não só ajudou muitos psiquiatras a tornarem-se melhores médicos, como também ajudou, de modo directo e indirecto, centenas de pacientes, tanto pessoalmente como por via dos médicos que ensinara e inspirara.»
Era óbvio que a publicação desconhecia as experiências que Cameron desenvolveu para a CIA.

Os dados relativos ao projeto MKUltra encontram-se na página 00213 do Memorandum for: Mr. Colby, com a data de 8 de Maio de 1973 e assinado por Ben Evans, e no Memorandum for: Deputy Director for Science & Technology. Subject: TSD Support to Other Agencies, com a data de 8 de Maio de 1973 e assinado por Sidney Gottlieb, chefe da TSD (Technical Services Division, Divisão de Serviços Técnicos). Este memorando ocupa as páginas 00215 e 00216 do relatório das «Jóias de Família». Também se cita o MKUltra no Memorandum for: Record. Subject: Frank K Olson, com a data de 9 de Dezembro de 1953 e assinado por Lawrence R. Houston, conselheiro-geral; o documento da relação da CIA com os doutores Sidney Gottlieb e Ewen Cameron, do Departamento de Psiquiatria do Allan Memorial Institute e dirigido à CIA, onde estabelece a natureza ilegal das experiências realizadas e a angariação de fundos; no Memorandum for: The Record. Subject: MKUltra Subproject 68, com a data de 18 de Março de 1957; e no Memorandum for: Allen Dulles. Subject: Continuation (McGill University) Project — (Cameron’s Psychic-driving), com a data de 9 de Maio de 1960 e assinado por J. L. M.