Mystery Hill, ou o Stonehenge americano, como acabou por ficar conhecido, situa-se em North Salem, no estado de New Hampshire, a cerca de sessenta e cinco quilómetros a norte de Boston. Este enigmático complexo megalítico encontra-se espalhado ao longo de uma área com cerca de cento e vinte metros quadrados e consiste num misto desordenado de pedras erectas, muros de pedra e câmaras subterrâneas. Mystery Hill não é uma localização isolada; pelo contrário, faz parte de um conjunto de centenas de locais com arranjos de pedras e câmaras subterrâneas fora do comum que se encontram na América do Norte, muitos dos quais em New England. Os exemplos do Massachusetts incluem a Câmara de Upton, túneis revestidos de pedra em Goshen e uma câmara de pedra semelhante a uma colmeia em Petersham. Também existem as câmaras e muros de pedra de Gungywamp em Groton, no Connecticut, e uma grande câmara de pedra em South Woodstock, no Vermont. As utilizações exactas de alguns destes edifícios fora do comum permanecem desconhecidas, mas muitas pessoas especularam que foram construídos por colonos europeus pré-históricos para a realização de encontros cerimoniais e eventos astronómicos.
A história recente de Mystery Hill começou com Jonathan Pattee, um agricultor que viveu no local entre 1826 e 1848. Existem vários relatos sobre Pattee, alguns dos quais sugerem que ele montara uma destilaria ilegal de bebidas alcoólicas no local. Uma história mais sustentável refere que ele e o seu filho Seth eram abolicionistas que operavam um apeadeiro do caminho-de-ferro subterrâneo que ajudava os escravos a fugirem do Sul. De facto, foram encontradas algumas provas para este facto sob a forma de grilhões descobertos no local e que agora se encontram expostos no Centro de Visitantes do Stonehenge americano. Durante os cinquenta anos seguintes houve pedreiros que compraram e removeram uma grande parte das estruturas de pedra de Mystery Hill. Pensa-se que a maioria das pedras foi levada para a cidade de Lawrence, no Massachusetts, para serem utilizadas na construção de uma barragem e de sarjetas. Em 1937, William Goodwin, um agente de seguros, comprou o local de Mystery Hill e durante as suas escavações fez muitas alterações estruturais para reforçar a sua teoria de que haviam lá vivido monges irlandeses. Consequentemente, a história deste local é agora extremamente confusa. Em 1950 Mystery Hill foi alugado por Robert Stone, que comprou a propriedade em 1956. Ele iniciou o restauro, estudo e conservação da área circundante, em 1958 construiu um centro para visitantes e abriu ao público o local que foi baptizado como «o Stonehenge americano» e que é agora uma importante atracção turística.
Uma das características mais enigmáticas de Mystery Hill é uma grande laje de pedra que pesa quatro toneladas e meia e mede cerca de três metros de comprimento por dois de largura, pousada sobre quatro pernas de pedra e assemelhando-se a uma enorme mesa. Esta apresenta um sulco profundo que percorre o seu contorno em direcção a uma bica, o que levou alguns a chamar-lhe «pedra sacrificial». De acordo com uma teoria popular, o sulco que contorna a pedra permitia escoar o sangue das vítimas de sacrifício para taças de libação. Infelizmente, esta pedra sacrificial mostra muitas semelhanças com outra pedra que está no Farmer’s Museum, no Oeste do Massachusetts. Mas em vez de estar ligado a sinistros rituais de sacrifício, este objecto era utilizado no processo de manufactura de sabão e é de facto conhecido como uma pedra de fazer lixívia. É um achado relativamente comum nos locais das antigas quintas coloniais de New England.
Outra característica do complexo de Mystery Hill é a grande quantidade de pedras com gravuras que lá foram encontradas ao longo dos anos. O falecido Dr. Barry Fell, professor de Biologia na Universidade de Harvard, conduziu uma pesquisa extensa sobre as inscrições de Mystery Hill e as de muitos outros locais da América do Norte. Ele afirmava (no seu livro de 1976 «America B. C.») que muitas destas inscrições eram de origem ogham (irlandês da antiguidade), fenícia e púnica ibérica. As inscrições, os alinhamentos astronómicos e o estilo megalítico da arquitectura levaram muitos a acreditar que Mystery Hill funcionava como um centro cerimonial pré-histórico, construído por imigrantes europeus. Conjectura–se que os fenícios (uma civilização marítima que existiu onde agora se encontram a Síria e o Líbano e que teve o seu auge entre 1200 a. C. e 800 a. C.) estiveram na América há pelo menos dois mil e quinhentos anos e fizeram trocas comerciais com a comunidade celta (tribos da Europa ocidental que prevaleceram entre os Séculos VII a. C. e I a. C.) que já vivia em Mystery Hill. Estas são, de facto, afirmações retumbantes; a questão que se coloca é se existem provas extraordinárias que as suportem. Em primeiro lugar, o livro de Fell foi amplamente desacreditado por arqueólogos e linguistas. As fotografias de «America B. C.» onde aparecem as supostas inscrições ogham e púnica são particularmente pouco convincentes. A maior parte das linhas e riscos identificados por Fell como escrita antiga parecem completamente aleatórios e seriam mais facilmente explicados como consequência da passagem fortuita de um arado ou como resultado dos métodos de extracção de pedra por parte dos agricultores; ou então seriam apenas as linhas, fissuras e rachas que encontramos naturalmente na maioria das rochas. Seria necessário reexaminar estas pedras com a ajuda de arqueólogos e epigrafistas para testar de forma mais concreta as afirmações de Fell. Infelizmente, dado que algumas das pedras gravadas foram retiradas de Mystery Hill e «guardadas em segurança», o seu contexto original perdeu-se, tornando a tarefa de as datar e identificar com precisão ainda mais difícil.
Se olharmos de perto para as provas arqueológicas de Mystery Hill, torna-se evidente que não suportam a teoria de que este local era um antigo complexo religioso ocupado pelos celtas e visitado pelos fenícios. A inexistência no local de artefactos pré-coloniais datáveis e encontrados no seu contexto original impede a demonstração das suas origens pré-históricas europeias. Escavações conduzidas por Gary S. Vescelius em 1955 recuperaram oito mil artefactos e todos eles sugeriam que o local fora ocupado no final do Século XVIII. Um facto importante sublinhado por Vescelius foi que muitos destes artefactos do Século XVII foram encontrados in situ por baixo e por dentro de muros de pedra na caverna Y, provando que a estrutura deve ser posterior a esses objectos. De facto, e até à data, não se encontrou qualquer objecto fenício ou celta num contexto arqueológico na América do Norte. Estes celtas e fenícios que supostamente estiveram na América a gravar inscrições não deixaram qualquer outro vestígio da sua presença, nem sequer um caco de cerâmica que provasse a sua passagem.
Muitas das construções de pedra inexplicadas em Mystery Hill e em outros pontos de New England podem ser atribuídas ao trabalho de agricultores dos Séculos XVIII e XIX, que erigiram muros para separar terrenos, alicerces de casas e estruturas de pedra para armazenamento. Algumas das estruturas que restam podem ter origem na população nativa americana local, como foi anotado por Edwin C. Ballard na sua pesquisa sobre as estruturas em forma de U que se encontram na área. Também existe a possibilidade de que partes do complexo de Mystery Hill fossem dedicadas à produção de potassa e de carbonato de potássio. A potassa é obtida através de uma mistura de cinzas de madeira com lixívia, à qual se extrai toda a humidade. A potassa é depois cozida numa fornalha até desaparecerem todas as impurezas de carbono resultando num pó fino e branco que é o carbonato de potássio. Existem várias referências que demonstram a importância da potassa e do carbonato de potássio na economia do país no Século XVIII. Em 1765, o governador do Massachusetts afirmou que a produção de potassa e de cânhamo e o transporte de madeira para Inglaterra constituíam as maiores actividades económicas das colónias.
A potassa era produzida em quintas e lares e vendida a negociantes, que depois a revendiam a fabricantes que a convertiam em carbonato de potássio nas suas fábricas conhecidas como ashies. Além da fornalha para transformar a potassa, estas fábricas continham uma pequena estrutura de pedra, chamada cinzeiro, na qual queimavam grandes quantidades de madeira. Estes edifícios possuíam um telhado com um buraco no meio e duas aberturas, uma de lado para deitar lenha no fogo e outra no fundo para retirar as cinzas. Tendo em consideração a pedra de fazer lixívia e as várias estruturas de pedra do local, é muito provável que este tipo de actividade tivesse lugar em Mystery Hill. As estruturas que outrora fizeram parte destas fábricas de carbonato de potássio nunca foram identificadas como tal, talvez porque uma explicação tão prosaica para este local não encaixe nas teorias dos que defendem actividades mais fantásticas para Mystery Hill.
Contudo, existem datas de carbono radioactivo, obtidas a partir de carvão vegetal que foi encontrado em conjunto com uma picareta e um martelo de pedra, que provam a ocupação humana de Mystery Hill no segundo milénio antes de Cristo. Mas estes artefactos indicam muito mais provavelmente a presença de americanos nativos do que de europeus da Idade do Bronze ou do Ferro. Alguns investigadores afirmaram que muitas das pedras em Mystery Hill estão em alinhamento com pontos astronómicos óbvios e que o local pode ainda hoje ser usado como um calendário astronómico preciso, utilizando as pedras para determinar eventos solares e lunares específicos durante o ano. No entanto, os assim designados alinhamentos celestiais do local (se não forem completamente fortuitos) podem ser atribuídos aos índios americanos, cujo interesse nos alinhamentos do Sol e da Lua pode ser observado noutros locais como as pirâmides de Kahokia, perto de St. Louis.
Qual é, então, a explicação para Mystery Hill? É provável que a origem do local se deva a um campo de caça nativo americano, provavelmente estabelecido algures durante o segundo milénio antes de Cristo. Quanto às estruturas no local, a sua vasta maioria pode ser explicada nos termos da actividade agrícola e industrial pós-colonial a partir do Século XVIII, apesar de uma ou duas permanecerem ainda como um enigma. O estado confuso em que se encontra o próprio complexo de Mystery Hill leva facilmente a mal-entendidos e é claro que, mesmo com uma série concisa de escavações, o mistério do local pode nunca ser resolvido. É óbvio que as pessoas são livres de pretender que o Stonehenge americano tenha uma origem pré-histórica europeia, mesmo que as provas disponíveis apontem numa direcção completamente diferente. No final, estas crenças dizem-nos mais acerca dos crentes do que das verdadeiras origens e funções de Mystery Hill.