« Uma mente que, a dado momento, tivesse total conhecimento de todas as forças vitalizadoras da natureza e da posição de todos os seres que compõem a natureza… seria capaz de aplicar uma e a mesma fórmula aos movimentos dos corpos celestes e aos átomos semelhantes mais leves. Nada seria incerto para tal mente e passado e futuro estariam imediatamente presentes.»
– O Marquês de Laplace, astrónomo e matemático francês do Século XVIII, expressando a esperança de tornar o futuro cientificamente previsível.
No início do terceiro milénio, o mercado da previsão é maior do que nunca. Nenhuma Sociedade alguma vez foi tão preocupada com o futuro como a nossa, quase tanto na esperança de um progresso surpreendente como no medo de catástrofes ecológicas ou nucleares.
As pessoas que procuram conhecimento do futuro tendem a optar por um dos dois caminhos marcadamente diferentes: por um lado, a ânsia pela Adivinhação de todos os tipos continua a aumentar. Grande parte das cidades ocidentais tem um pequeno exército de astrólogos, cartomantes e videntes com bolas de cristal, enquanto jornais e revistas de grande circulação no mundo inteiro não dispensam as colunas de horóscopo entre as páginas mais populares. Porém, juntamente com esta tradição antiga, que dá continuidade a métodos seculares de previsão em novas embalagens, tem crescido uma indústria de muitos milhares de milhões de dólares supostamente baseada em formas mais científicas de previsão.
Os novos peritos actuam em diversas áreas. Há físicos que prevêem a probabilidade de ocorrência de terramotos, erupções vulcânicas ou queda de meteoros ou de cometas. Demógrafos e actuários estudam tendências futuras relacionadas com a população e a idade com que as próximas gerações deverão adoecer e morrer. Batalhões de consultores de gestão e estrategas de mercado ganham a vida a aconselhar empresas e corporações a adaptar métodos de trabalho a um mundo em mudança. Acima de tudo, toda uma indústria tem crescido em torno da previsão económica, desde os especialistas do Banco Mundial e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económicos (OCDE), que se propõem a prever padrões globais de criação de riqueza e distribuição, aos analistas de investimento dedicados a antecipar a próxima tendência do mercado de acções.
Uma ciência que já oferece possibilidades de previsão genuína é a genética. A sua aplicação mais evidente centra-se na utilização do conhecimento sobre a predisposição para uma doença de forma a evitar a transmissão por hereditariedade. Como exemplo do que se pode conseguir, um Comité para prevenção de doenças genéticas judaicas nos Estados Unidos é responsável pelas análises de sangue de crianças que frequentam a escola. Quando duas pessoas consideram casar-se, um casamenteiro da comunidade pode telefonar para a organização e, através dos números atribuídos durante as análises em vez dos nomes, para assegurar o anonimato, pode verificar se o casal tem mutações responsáveis por fibrose cística ou a rara, porém letal, doença de Tay-Sachs. Se ambos forem positivos, o comité aconselha-os a não se casarem. Os resultados já foram dramáticos; a fibrose cística, em particular, tem sido amplamente erradicada da comunidade judaica.
Profetas da Natureza
Em algumas áreas, os cientistas viram-se no lugar dos adivinhos de antigamente, como acontece na previsão do tempo. A necessidade de prever uma seca ou inundação é quase tão antiga como a agricultura e, desde os primórdios, as pessoas voltaram-se para indivíduos que afirmavam ter conhecimento especial para descobrir o que lhes estava reservado. Em caso de falta de confiança na Astrologia como forma de previsão, como acontecia na antiga Babilónia, as pessoas voltavam-se antes para a tradicional sabedoria popular sobre o tempo, um guia geralmente mais preciso, muitas vezes baseado na observação da Natureza. Por exemplo, sabe-se que certas plantas fecham as pétalas em antecipação à chuva e que o gado se agrupava desordeiramente antes de uma tempestade.
Com o surgimento da era científica, a mudança dá-se lentamente. Houve um avanço prático de grande importância, antes de mais, com a invenção do termómetro pelo grande Galileu e, de seguida, em 1644, do barómetro, por Evangelista Torricelli. O barómetro indicava perspetivas atmosféricas através do movimento do mercúrio num tubo. Porém, apenas se verificou o progresso teórico de destaque com o conceito, formulado no final do Século XVII, da atmosfera da Terra, onde se forma a temperatura.
Os cientistas reuniram cada vez mais dados sobre condições atmosféricas no Século XVIII e no início do XIX, mas um serviço de previsão internacional eficaz teve de aguardar o desenvolvimento do telégrafo eléctrico, que permitiu pela primeira vez que as notícias de meteorologia fossem transmitidas mais depressa do que os próprios sistemas de previsões. A primeira rede de previsão internacional eficaz entrou em funcionamento a partir de Paris em 1860. Verificou-se, então, uma evolução constante do apuro da qualidade da previsão, principalmente no início do Século XX em resposta ao desenvolvimento da aviação, que proporcionou um novo e exigente mercado de informação de última hora.

Hoje em dia, a previsão meteorológica é, de facto, um negócio de grande dimensão. Em 1995, a Organização Meteorológica Mundial calculou que o orçamento global para tal mercado rondava os quatro mil milhões de dólares, dos quais cerca de metade dizia respeito somente aos Estados Unidos. A meteorologia é uma das poucas áreas em que a previsão é verificada estatisticamente para ser exacta. Os números demonstram que a previsão de curto espaço (com antecedência de até dois dias) costuma ser fiável, pelo menos no geral. Contudo, as previsões a longo prazo ainda se baseiam muito na projecção de padrões meteorológicos anteriores, sendo, por isso, intrinsecamente não fiáveis.
Ainda assim, a meteorologia constitui um dos sucessos da Ciência da previsão. Os sismólogos, por exemplo, têm alcançado enormes avanços no conhecimento dos movimentos subterrâneos da Terra, mas ainda estão longe de ser capazes de prever terramotos com certeza absoluta.
Os astrónomos que estudam corpos celestes de grandes dimensões trabalham com um grau bem maior de certeza quanto ao futuro. O padrão regular subjacente à passagem do cometa Halley pela Terra foi observado pela primeira vez por Edmond Halley, já em 1704. Porém, os observadores podem ainda ser surpreendidos por asteroides mais pequenos. Uma das preocupações actuais da NASA é catalogar os asteróides com órbitas próximas da Terra, na esperança de listar noventa por cento dos corpos com mais de 1 quilómetro de diâmetro. Os últimos registos revelam que, por volta de Agosto de 2007, terão sido descobertos 4711 asteróides próximos da Terra, incluindo mais de 600 com um diâmetro superior a 1 quilómetro.
Ciências humanas
No que diz respeito às ciências humanas, os índices de erro na previsão aumentam exponencialmente. Mesmo a estimativa do número de pessoas que estarão vivas numa determinada data é incerta (um cálculo básico no qual tudo depende, desde necessidades futuras de comida a nível mundial até pensões individuais). Nos últimos cinquenta anos, os demógrafos têm tido sucesso no geral; as previsões quanto ao crescimento da população mundial concretizaram-se. Estiveram igualmente próximos dos números relativos ao aumento da esperança média de vida nos países desenvolvidos. Porém, estes sucessos envolveram a projecção de uma tendência constante. Sempre que se verificou um desvio do padrão (por exemplo, com a explosão demográfica nos anos que se seguiram à Segunda Guerra Mundial), os cálculos demográficos não conseguiram identificar a descontinuidade, dando origem a resultados desfasados.
Os demógrafos são grandes extrapoladores, mas, por outro lado, não são profetas. O mesmo se aplica ainda com mais vigor aos economistas. A previsão económica tem sido uma área de crescimento: em 1996, havia cerca de 150 mil economistas apenas nos EUA, a maioria dos quais a trabalhar numa qualquer forma de projecção. Todos os anos, os governos e as empresas gastam grandes quantias de dinheiro para a previsão de futuras tendências económicas. No entanto, os resultados sugerem que tais despesas reflectem a importância que se dá ao tema, ao invés da fiabilidade das respostas fornecidas. Os economistas não tiveram sucesso algum ao anunciar o início ou final de qualquer das grandes recessões económicas pós-guerra. Os especialistas em investimentos não demonstraram, no geral, ter mais previdência. Foi a constatação de que, com o tempo, nem os notáveis gestores de fundo conseguiram acompanhar o mercado, que levou ao aumento de popularidade dos fundos–índice nos anos 90.
A mensagem é, assim, bem simples. A ciência da previsão pode ser extraordinariamente eficiente em detectar tendências ou padrões passados ou presentes e projectá-los a nível hipotético para o futuro. É, porém, bastante inabilitada em prever interrupções súbitas ou acidentes, justamente as mudanças cataclísmicas que têm sido tradicionalmente o campo da profecia inspirada. O facto de «previsões científicas» terem assumido algo de profético revela mais sobre o prestígio actual da Ciência do que as suas capacidades proféticas. Talvez seja insensato esperar o contrário; quando nem a CIA, o exército norte-americano e os especialistas de defesa a nível mundial conseguiram prever algo tão importante como o colapso da União Soviética e do bloco comunista do leste europeu no final da década de 80, a capacidade limitada do conhecimento dos peritos em pressagiar acontecimentos futuros permanece dolorosamente exposta.
O susto do Bug do Milénio
O susto do chamado «bug do milénio» foi objecto de uma lição nos limites da ciência da previsão. Os meios de comunicação pelo mundo inteiro sugeriram, na altura, que haveria um caos generalizado, porque o software dos sistemas informáticos, programado para reconhecer apenas anos terminados em dois dígitos, confundiria 2000 com 1900 e pararia efectivamente de funcionar. Foram gastas enormes quantias com o problema (só os EUA contavam com um orçamento de sete mil milhões e meio de dólares). No entanto, com a chegada do dia 1 de Janeiro de 2000, não ocorreu nenhum dos tumultos previstos. Os argumentos de que uma preparação antecipada eficaz solucionara o problema não convenceram, pelo facto de mesmo países que tomaram poucas precauções, como a Rússia, terem saído da situação ilesos. Tal desfecho provou que a histeria dos Meios de Comunicação Social no final do ano de 1999 transformara um problema técnico de pouca importância numa clássica, porém incorrecta, profecia de fatalidade do pré-milénio.
Fonte: Livro «As Profecias que Abalaram o Mundo» de Tony Allan