Talos: um Robot grego da Antiguidade?

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Talos é um homem de bronze, que, quase invulnerável, rondava a ilha, lançando pedras contra as naus que se aproximassem para que não chegassem a acostar
Talos é um homem de bronze, que, quase invulnerável, rondava a ilha, lançando pedras contra as naus que se aproximassem para que não chegassem a acostar

Muitas pessoas estão familiarizadas com a figura de Talos através da sua representação como um gigante de bronze no filme de 1963, «Jasão e os Argonautas», que utilizou os fantásticos efeitos especiais de Ray Harryhausen. Mas de onde veio a ideia de Talos? Poderá ele ter sido o primeiro robot da História?

Originalmente, Talos foi uma figura das lendas cretenses, apesar de haver vários mitos para a sua origem. Depois de Zeus ter raptado Europa e a ter levado para Creta, ofereceu-lhe três presentes para demonstrar o seu amor, um dos quais era Talos, o autómato gigante de bronze. Noutra versão da lenda o gigante foi forjado por Hefesto e pelos Ciclopes e oferecido a Minos, rei de Creta. De acordo com um outro mito, Talos era o filho de Cris e pai de Festos, ou era irmão de Minos. Outras diziam que ele era de facto um touro, provavelmente idêntico ao Minotauro do Labirinto de Creta. De acordo com «Argonautica», do antigo escritor Apolodoro de Rodes, ele pode ter sido o último de uma geração de homens de bronze, oriundos dos freixos e que sobreviveram à era dos semideuses.

Talos, ou Talus, no antigo dialecto cretense significa Sol e em Creta o deus Zeus também tinha o mesmo nome, Zeus Tallaios. Talos era o guardião da ilha de Creta e percorria a costa da ilha três vezes por dia para impedir uma invasão inimiga, bem como para impedir que os seus habitantes saíssem sem a autorização de Minos. Ele também se deslocava três vezes por ano às aldeias de Creta, levando com ele placas de bronze onde estavam inscritas as leis sagradas de Minos, sendo responsável pelo cumprimento dessas leis no país. Dizia-se que Talos atirava enormes rochedos aos navios inimigos que se aproximavam para que não desembarcassem na ilha. Se o inimigo conseguisse passar esse bombardeamento inicial, o gigante de bronze saltava para o interior de uma fogueira até ficar ao rubro e envolvia os forasteiros num abraço escaldante à medida que desembarcavam na ilha. Também foi dito que Talos esteve na posse dos Sardenhos e que, quando se recusaram a entregar o homem de bronze a Minos, Talos saltou para uma fogueira e agarrou-os junto ao peito até morrerem de boca aberta. Este incidente deu origem, segundo consta, à expressão riso sardónico, que se aplica àqueles que riem do seu sofrimento ou do dos outros.

Talos
Talos

Jasão e os Argonautas tiveram um encontro com Talos quando se aproximaram de Creta a caminho de casa, depois de terem obtido o Tosão Dourado. O gigante manteve o seu navio, o Argo, à distância, atirando na sua direcção grandes rochedos que havia arrancado dos penhascos. Medeia, a bruxa que acompanhava Jasão, ajudou-os com a sua magia a escapar dos destruidores arremessos de Talos. Ficou registado que Talos tinha uma única veia vermelha coberta por uma pele fina que ia do pescoço ao calcanhar, fechada por um prego de bronze. Este prego selava o ichor divino (uma substância oleosa muitas vezes chamada sangue dos deuses), que permitia que os seus membros de metal se movessem. Este era o único ponto vulnerável no seu corpo. Na «Argonautica», Medeia enfeitiçou o gigante com um olhar hostil e invocou os Keres (espíritos da morte) com cânticos e preces. Quando Talos tentou arremessar rochedos, para repelir os espíritos, arranhou acidentalmente o tornozelo com uma pedra afiada numa zona onde se escondia a sua vulnerável veia. Caiu ao chão com um grande estrondo, fazendo com que o ichor divino jorrasse como chumbo derretido. Numa outra versão, Medeia encantou o homem de bronze e enganou-o, dizendo que lhe daria uma poção secreta que o tornaria imortal se ele a deixasse desembarcar na ilha. Talos concordou e bebeu a poção, que o adormeceu imediatamente. Medeia aproximou-se dele durante o sono e puxou o selo do seu calcanhar, matando-o.

Talos
Talos

Outros acreditavam que o argonauta Poias (pai de Filoctetes, que lutaria na Guerra de Tróia) furara a veia do gigante com uma seta. Depois da morte de Talos, o argo conseguiu desembarcar em Creta com segurança. Há imagens de Talos em moedas datadas do IV ao III Século a. C. que foram encontradas na cidade cretense de Festos. Um vaso vermelho com figuras do final do Século V d. C. mostra os Dioskouroi (os deuses-heróis Castor e Polideuces) apanhando Talos já moribundo, enquanto Medeia, com vestes orientais, permanece junto ao Argo segurando um saco bordado (que presumivelmente continha as suas drogas e poções mágicas).

Existem várias formas de interpretar o mito do homem gigante de bronze de Creta. A história tem muitas parecenças com o destino semelhante que Aquiles sofreu na Guerra de Tróia e talvez tenham a mesma origem. Uma interpretação política sugeriria que Talos representava a frota minóica empunhando armas de metal. Quando os Gregos continentais do Argo derrotaram Talos, o poder de Creta desapareceu e o controlo do mundo grego passou para o continente. Talvez os portos de Creta estivessem infestados de piratas e Talos representava a guarda minóica contra os piratas sob a forma de patrulhas. O poeta Robert Graves sugeriu que a veia única de Talos é uma alusão a um método chamado cire-perdue (cera perdida) utilizado na antiguidade para cobrir objectos de bronze, que consistia na produção de um modelo de barro que depois era coberto com cera. Este modelo era depois coberto com um molde perfurado de barro. Quando aquecido, o molde perdia a cera (daí o nome do método), que escorria pelos orifícios. Depois o metal em forma líquida era vertido no espaço que fora ocupado pela cera.

Foi sugerida uma interpretação religiosa/ritual aquando da descoberta de selos minóicos de pedra datados de cerca de 1500 a. C., que mostravam uma deusa ou sacerdotisa remando um barco até santuários à beira-mar, indicando uma circum-navegação divina à ilha semelhante à patrulha do gigante de bronze. Como Talos é a palavra cretense para o Sol, Robert Graves sugeriu que ele, como o Sol, daria a volta a Creta uma vez por dia. E, como Talos, uma imagem do Sol de bronze, também se chamava Tauros (touro) e o ano cretense era dividido em três estações, a sua visita às aldeias três vezes por ano poderia ter sido uma procissão real do Rei-Sol, usando a sua máscara de touro ritual.

Outra teoria é que Talos representa o primeiro robot completamente funcional da História. Calculou-se que se Talos pudesse fazer o circuito de Creta três vezes por dia, isso significaria que tinha uma velocidade média de duzentos e cinquenta quilómetros por hora. Os proponentes deste ponto de vista apontam que, quando o gigante foi ferido no tornozelo, o que dele jorrou parecia ser algo semelhante a chumbo derretido. Em geral, os Gregos eram fascinados por autómatos de todos os tipos, utilizando-os muitas vezes em produções teatrais e em cerimónias religiosas. Existe alguma história sobre a robótica da antiguidade, se bem que numa forma primitiva. Em 350 a. C., o brilhante matemático grego Arquitas construiu um pássaro mecânico, chamado O Pombo, que era movido a vapor. Foi um dos primeiros estudos sobre o voo e possivelmente o primeiro modelo de aeronave. Em 322 a. C. o filósofo grego Aristóteles, talvez prevendo o desenvolvimento dos robots, escreveu: «Se todas as ferramentas, quando lhes mandam, ou mesmo por sua iniciativa, pudessem fazer o seu trabalho… então não haveria necessidade de aprendizes para os mestres, nem de escravos para os senhores.» No final do século III a. C., o inventor e físico grego Ctesíbio de Alexandria desenhou relógios de água com figuras móveis, que mediam o tempo de forma mais precisa do que qualquer relógio inventado até ao Século XVII.

Robot de Da Vinci
Robot de Da Vinci

Mais de mil e seiscentos anos mais tarde, cerca de 1495 d. C., Leonardo da Vinci concebeu (e talvez tenha construído) um cavaleiro mecânico com armadura, provavelmente o primeiro robot humanóide da História. Os mecanismos no interior do robot de Da Vinci, um homem artificial de dar corda, foram concebidos para criar a ilusão de que lá dentro se encontrava uma pessoa de verdade. Este robot podia sentar-se, acenar e mexer a cabeça, enquanto abria e fechava um maxilar anatomicamente correcto. Pode até ter emitido sons, que seriam acompanhados por instrumentos musicais automáticos, como tambores. Com efeito, houve bastantes inventores nos tempos medievais que construíram máquinas semelhantes para entreter a realeza. O robot de Da Vinci foi vestido com uma típica armadura germano-italiana do final do Século XV. Examinando os desenhos de Da Vinci, aparentemente todas as juntas se moviam em uníssono, impulsionadas e controladas por um programador analógico localizado no peito. As pernas eram impulsionadas separadamente por uma manivela externa, que puxava um cabo ligado a partes importantes no tornozelo, no joelho e na anca.

Em 2005, a Faculdade de Engenharia Bioquímica da Universidade do Connecticut deu início a uma recriação da estrutura básica do robot original de Da Vinci. A sua concepção irá incorporar Tecnologias do Século XXI como «visão, reconhecimento de fala, comandos por voz, movimentos controlados por computador e uma estrutura corporal mais avançada». O robot também possuirá um pescoço móvel e terá a capacidade de seguir com os olhos objectos em movimento. Esta recriação irá funcionar em dois modos distintos: um que obedecerá a comandos de um computador e outro que responderá a comandos de voz. O mecanismo original de Da Vinci será utilizado em conjunto com modelos de músculos que imitarão movimentos humanos de forma mais natural.

Tudo isto parece muito distante da Grécia da antiguidade. Contudo, mesmo que Talos tenha provavelmente sido apenas uma personagem mitológica, o homem gigante de bronze de Creta foi talvez o protótipo de todos os robots modernos.

Fonte: Livro «História Oculta» de Brian Haughton

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