O dia 5 de Dezembro de 1945 foi um dia típico de inverno do Sul da Florida – ventos variáveis, uma manhã fria e uma tarde refrescante com um céu claro. A Estação Aero-Naval de Fort Lauderdale, estava em plena actividade. A Segunda Guerra Mundial acabara há uns quatro meses. Além dos navios que permanentemente ali estavam ancorados e dos TBM (Torpedo Bomber Medium), havia um grande movimento de pessoal aéreo e naval esperando a sua desmobilização. Os cabeçalhos do Herald de Miami desse dia afirmavam o seguinte: «CIO rompe com Truman.» O meteorologista previra uma baixa de temperatura de três graus para a manhã seguinte. Três recrutas de artilharia naval instalados na base – sargento Robert Gallivan, de Northamptom, Massachussetts; soldado de primeira classe Robert Gruebel, de Long Island City, Nova York e o cabo Allen Kosnar de Kenosha, Wisconsin – não estavam nada interessados nem em política nem no tempo que faria no dia seguinte, quando voltaram para a caserna, vindos do refeitório, depois do almoço. O assunto da sua conversa era passar o Natal em casa e se deviam assistir nessa noite à primeira ou à segunda sessão no cinema da base. O filme chamava-se “E que mais, cabo Hargrave?“, tendo Robert Wlaker como intérprete – produção que nunca deveriam ver.
Todos os três estavam designados para participar num voo de treino nessa tarde, com uma esquadrilha de cinco TBM da marinha, também conhecidos como Avengers. Tendo mais de uma hora ao seu dispor antes de se apresentarem, os três fuzileiros navais decidiram ir descansar algum tempo nos seus beliches.
Quando chegou a hora de deixar a caserna para se dirigirem à sala de operações para as instruções de voo, o cabo Kosnar teve o estranho pressentimento de que não deveria participar no voo. Não teve problema em obter dispensa, porque já tinha completado as horas obrigatórias de voo desse mês. Bob Gallivan e Bob Gruebel dirigiram-se com outros doze fuzileiros para o centro operacional.
A missão do dia para a Flight 19, tal como a esquadrilha foi designada, era um exercício de rotina. Mal sabia qualquer dos seis marinheiros e oito fuzileiros que a operação seria mais tarde designada como um dos “mais estranhos e insolúveis mistérios do mar”.
Vinte e quatro anos depois, Allen Kosnar voltou ao Aeroporto de Fort Lauderdale para realizar um documentário sobre os estranhos e insolúveis mistérios do mar. Quando andava a explorar os velhos edifícios navais, agora utilizados como liceu, apontou para um que lhe parecia familiar. O vestiário de educação física dos rapazes era a velha caserna em que estivera instalado com Gallivan, Gruebel e a maior parte dos outros homens da esquadrilha Flight 19. Quando passou em frente da fila de armários e bancos, Kosnar manteve-se silencioso – embrenhado em profundos pensamentos. Como as vidraças das janelas haviam sido pintadas, a sala estava mais escura do que fora. Ao sair para a luz do Sol, pestanejou e disse: “Por qualquer razão que não posso explicar, naquele dia decidi não tomar parte do voo.”
Para o sargento Gallivan, artilheiro aéreo, veterano com três anos de combate no Pacífico, o voo não passava de um exercício de rotina. Para o soldado de primeira classe Gruebel, com menos de um ano de serviço, era uma maravilhosa oportunidade para voar. Os camaradas chamavam-lhe o «Io-Io», porque nunca perdia uma ocasião para voar. No entanto, a sua aspiração era entrar para a vida religiosa quando acabasse o serviço militar. Escrevera à família dizendo-lhe que dentro de poucas semanas estariam juntos na missa do Natal.
A Flight 19 estava sob o comando do tenente Charles C. Taylor, de Corpus Christi, Texas, há seis anos veterano da Marinha. Voando com ele no avião de comando iam o radiotelegrafista aviador de terceira classe Walter Parpart e a ordenança, aviador também de terceira classe, George Devlin. Os dois homens eram do mesmo bairro de Brooklyn. Os outros pilotos e a sua tripulação eram o guarda-marinha Joseph Bossi, de Arkansas City, Kansas; marinheiro de primeira classe Herman Thelander, de Kimbrew, Minnesota; marinheiro de primeira classe Bert Valuk, de Bloomfield, New Jersey; tenente da Marinha Forest Gerber, de Nova Ulm, Minnesota, e o soldado de primeira classe William Lightfoot, de Lexington, Ilinóis (Kosnar devia ter ocupado o lugar de artilheiro neste avião); o capitão da Marinha George W. Stivers, de Piedmont, Missouri (Gruebel e Gallivan voavam neste avião); e o capitão da Marinha Edward Powers, de Mont Vernon, Nova York; sargento do Estado-Maior Howel Thompson, de Chicago, Ilinóis e o sargento George Paonessa, de Mamaroneck, Nova York, também adstrito ao Estado-Maior.
Eram 13 horas e 30 minutos quando os cinco pilotos e as respectivas tripulações se apresentaram ao último controlo de voo para verificação dos aviões. O Avenger era um dos maiores e mais poderosos aviões de hélice de um só motor que jamais existira. Servia tanto de avião de carreira como nas bases da ilha. Tinha uma envergadura de asa de mais de cinquenta e dois pés (um pouco menos de dezasseis metros) e era movido por um motor «Wright Cycline», de mil e seiscentos cavalos. O aparelho podia atingir uma velocidade de perto de trezentas milhas por hora (mais de 480 km/h), e transportar quer um torpedo que duas mil libras (900 kg) de bombas. Os três homens da tripulação eram um piloto, um radiotelegrafista e um artilheiro. Os TBM tiveram no seu activo algumas das mais decisivas vitórias aeronavais da América, no Pacífico, durante a Segunda Grande Guerra. Verdadeiramente espectacular foi o afundamento do maior navio de guerra do mundo, o Yamato, conjuntamente com a sua escolta, que era composta pelo cruzador Yahagi e quatro contratorpedeiros. Todos estes seis navios foram para o fundo em menos de uma hora, depois do primeiro Avenger os ter localizado.
A previsão do tempo para o voo indicava ventos de superfície de vinte nós (37 km/h), com rajadas de trinta, e algumas nuvens. Se bem que estas condições atmosféricas fossem más para pequenos aparelhos, era o tempo ideal para um TBM poder voar.
Às 14 horas, o avião do tenente Taylor estava no ar, e dez minutos depois os cinco aviões com os seus catorze homens voavam em formação dirigindo-se para leste, sobre o Atlêntico, para os destroços de um navio que servia de alvo, mesmo no sul de Bimini, nas Bahamas. Depois de simularem lançamentos de torpedos ao casco do barco, a Flight 19 reagrupou-se e começou com a missão do dia – um voo de treino de rotina, que estava programado de modo a levá-los cento e sessenta milhas para leste, quarenta para norte, depois para sudoeste, de volta à base -, um triângulo que se adapta muito bem às Bermudas ou ao «Triângulo do Diabo».
Às 15 horas e 45 minutos, quinze minutos antes do voo terminar, o cabo Kosnar estava na sala de convívio da caserna pondo um selo numa carta que acabar de escrever aos pais. A cento e cinquenta milhas, na costa da Florida, na Estação Aero-Naval de Banana, presentemente Base da Força Aérea Patrick, que serve o Cabo Canaveral, o tenente Harry G. Cone, de Gainesville, Florida, e a sua tripulação de doze homens tinham acabado de comunicar com a sala de operações. Como rotina, tinham de ficar ali como “tripulação a postos”, não fosse algum dos enormes aviões Martin Mariner PBM ser chamado a participar de uma busca ou de uma missão de salvamento. Os operadores da torre da Estação Aero-Naval de Lauderdale esperavam ser rendidos às 16 horas. Quando o chefe das operações de rádio verificava o livro de bordo, antes de o entregar ao seu substituto, a torre recebeu uma mensagem aflitiva do tenente Taylor:
– Chamando a torre, é um caso de emergência. Parece que saímos fora da rota. Não conseguimos ver terra … repito … não conseguimos ver terra.
– Qual é a vossa posição ? – perguntaram da torre.
– Não temos a certeza da nossa posição – respondeu o tenente Taylor. – Não temos a certeza donde estamos. Parece que estamos perdidos.
Os operadores ficaram impressionados. Como podia ser, cinco aviões com tripulações experimentadas estarem perdidos com tão boas condições de voo?
– Julgam estar a dirigir-se para oeste? – perguntou a torre de controlo.
Taylor respondeu:
– Não sabemos para que lado é o oeste. Está tudo errado … tudo é estranho. Até o oceano parece diferente.
Depois das 16 horas o comandante de voo entregou subitamente o comando ao capitão Stivers, com quem voavam Gallivan e Gruebel. Nesta altura já em toda a base se sabia o que estava a acontecer com a esquadrilha.
Kosnar precipitou-se para a torre e, às 16 horas e 25 minutos, ouviu a voz do capitão Stivers:
– Não sabemos onde estamos. Pensamos estar a duzentas e vinte e cinco milhas a nordeste da base.
Depois de alguns segundos de silêncio ouviu-se a mesma voz dizer:
– Parece que estamos a entrar num água branca.
Por fim, uma voz angustiada:
– Estamos completamente perdidos.
Depois silêncio.
Nesta altura, já o tenente Cone se dirigia para o Atlântico, saindo de Rio Banana em direcção à última posição fornecida pela Flight 19. O hidroavião Mariner, com os seus cento e vinte e quatro pés de envergadura de asa, era maior que uma fortaleza voadora. A sua tripulação – treze homens – estava bem treinada em operações de busca e salvamento. O gigantesco aparelho levava todos os tipos imagináveis de apetrechos de salvamento, desde a jangada salva-vidas auto-insuflável até aos transmissores de rádio que uma vez em contacto com a água podem transmitir sinais durante horas. O avião levava combustível para ficar no ar mais de vinte e quatro horas.
Menos de meia hora depois, o operador de rádio do Mariner telegrafista-aviador de terceira classe J.Jorden, de Oakland, Califórnia, enviou para a base uma mensagem que dizia que se aproximavam da última suposta posição dos cinco Avengers perdidos, mas que não conseguiam ver nada. Desta tripulação faziam parte o tenente J.G.W.G. Jeffrey, de Los Angeles, Califórnia; guarda-marinha R.M. Allen, de Sunter, Carolina do Sul; guarda-marinha G.D. Arceneaux de Lafayette, Indiana; guarda-marinha L.A. Eliason, de Montevideo, Minnesota; ordenança de terceira classe J. Mendez, de Jacksonville, Florida; imediato maquinista de primeira classe D.E. Peterson, de Carpenter, Arkansas; marinheiro de primeira classe W.D. Cargill, de Columbus, Alabama; radiotelegrafista de terceira classe R.C. Cameron, de Hondo, Texas; marinheiro de primeira classe P.B. Newman, de North III, Pensilvânia; ordenança de terceira classe J.F. Osterheld, de Salinas, Califórnia; e o marinheiro de primeira classe Joseph Zywicki, de Chicago, Ilinóis.
O Mariner enviou mais uma informação referente à posição em que se encontravam. Foi então que o número treze se revelou fatal para Harry Cone e para a tripulação de doze homens do gande PBM, pois nada mais se soube do grande gigante.
Às 19 horas e 4 minutos, a torre da Estação Aero-Naval Opa Locka, em Miami, captou uma fraca mensagem: «FT – FT.» Eram parte das letras de chamada da Flight 19. Poderia um dos Avengers ter-se mantido no ar quase duas horas depois de ao último avião da esquadrilha ter faltado combustível? Nenhum outro avião teria usado estas letras.
Navios e guarda-costas fizeram-se ao mar imediatamente depois de perdido o contacto com o Mariner. Na madrugada do dia seguinte, duzentos e quarenta e dois aviões e dezoito unidades de superfície empenharam-se na busca, à qual se junto o porta-aviões Solomons e os seus trinta e cinco aviões. Foi a mais intensa caça aeronaval jamais realizada. À medida que o tempo passava, mais navios e aviões se juntavam na busca, que abarcava duzentas e oitenta mil milhas quadradas (mais de 725 mil km2). Até às Everglades e o golfo do México foram investigados. Por terra partiram grupos que pesquisaram centenas de milhas das costas da Florida e das Bahamas.
Na Segunda-Feira, 9 de Dezembro, um avião da US Air Force comunicou avistar duas jangadas salva-vidas a trezentas milhas a nordeste de Miami. Um barco guarda-costas enviado para o local informou tratar-se apenas de simples caixas de embalagem. Ao escurecer do dia 10 de Dezembro foi decidido cancelar as buscas.
O Departamento da Marinha estava perplexo. Como podiam ter desaparecido seis aviões e vinte e sete homens numa área relativamente pequena do Oceano Atlântico? Mais tarde , depois de um inquérito naval, no qual o tenente Taylor foi postumamente absolvido de qualquer culpa, um dos membros do inquérito concluiu: «Nem sequer nos pode passar pela ideia o que aconteceu.» «Desapareceram tão completamente como se tivessem voado para Marte» – disse um outro oficial. O porta-voz dos guarda-costas comentou: «Não sabemos o que se passa naquela zona.»
Muitas teorias, que vão desde a dos OVNIs a uma maciça colisão, foram aventadas, mas nada de conclusivo foi aprovado. Se tivesse havido uma colisão maciça que envolvesse os cinco Avengers, seguramente que teriam sido encontrados destroços. Cinco aviões não ficam simultaneamente sem combustível. Quando um caísse, um dos outros teria comunicado o acidente pela rádio, e assim por diante, até o último desaparecer. Há muitos exemplos de Avengers serem obrigados a descer no mar e de se manterem a flutuar durante trinta minutos. Todos os aviões que faziam parte da Flight 19 levavam jangadas salva-vidas auto-insufláveis e outro material que permitiria às suas tripulações sobreviver.
Richard Adams, agora corrector de imóveis em Fort Lauderdale, pilotou um dos aviões de salvamento durante as buscas. Lembra-se que, nesse dia, uma frente fria envolveu a área, provocando uma abrupta modificação da direcção do vento. Esta alteração poderia ter feito com que o voo, que compensava ventos de sudeste de vinte a trinta nós, os tivesse afastado várias centenas de milhas para o sul da posição a alcançar com ventos de noroeste de quarenta nós. Mas se tivesse sido esse o caso, os aviões encontrar-se-iam algures junto da ilha de Andros ou das Exumas, nas Bahamas. E desde o instante da sua primeira indicação de dificuldades até à última mensagem, é evidente que a tripulação podia ter visto uma das muitas ilhas. Quanto ao aparelho que faltava, Adams sugere que aquele tipo de avião era muitas vezes designado como «tanque voador», devido aos enormes tanques de combustível de que dispunha. Referiu-se ao costume do piloto ou co-piloto passarem uma busca às tripulações antes de cada voo, procurando fósforos ou isqueiros, devido ao perigo de incêndio. Adams afirma que Cone e a sua tripulação levantaram voo com tal pressa que esta precaução foi descurada, e alguém da tripulação pode ter tentado acender um cigarro.
Um navio mercante, o S.S. Gaines Mills, informou ter visto e ouvido uma enorme explosão ao largo de Merlbourne Beach, às 19 horas e 30 minutos daquela noite. Mas isso devia ter acontecido duas horas depois do envio da última mensagem. A enorme máquina voadora certamente não se teria mantido em silêncio durante tanto tempo enquanto duravam as operações de busca e salvamento, e se um rádio se inutilizasse, o aparelhava levava um outro completamente independente do primeiro. Se acontecesse os dois terem-se avariado, o avião deveria ter voltado imediatamente à base. Considerando o caso de uma explosão, tem que se afirmar que não foram encontrados quaisquer destroços.
Fonte: Livro “O Mistério do Triângulo das Bermudas” de Richard Winer
Índice do Caso da Flight 19: https://paradigmas.online/?p=5122
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